A escola transige com a imposição de significados: a interlocução e a obstaculizar o direito à participação - por Fabiana Juvêncio

A escola transige com a imposição de significados: a interlocução e a obstaculizar o direito à participação - por Fabiana Juvêncio

A escola transige com a imposição de significados: a interlocução e a obstaculizar o direito à participação

 

         A escola transige com a imposição de significados às ações que ocorrem no seu interior e suprime a possibilidade de discutir assuntos públicos, está claramente a impedir a interlocução e a obstaculizar o direito à participação e, por isso mesmo, a atentar contra a sua própria identidade democrática (Beltran Llavador, 2000: 87). É que, ainda segundo este autor, se a política é uma emanação do espaço público ou o espaço em que se inscreve a tensão entre consenso e conflito, o espaço público, por sua vez, não é possível sem uma determinada política, isto é, sem uma determinada forma de gestão dos assuntos que afetam a coletividade (ibid.: 88). Para tal, é necessária a comunicação que faz política na medida em que permite exprimir o conflito, mas também frequentemente gerá-lo. Neste sentido, a escola como lugar de vários sentidos e de relações inscritas em práticas, que são também discursivas, exige a comunicação que, por seu turno, produz a escola porque recria o vínculo entre quem a integra.

         Embora a globalização possa definir-se de vários modos, ou seja, como um fenômeno multifacetado e multinível (Estevão, 2002). Contudo, a globalização representa também, ainda segundo Arruda (2000: 51), um progresso na história humana. Se ela se orientar pela globalização, isto é, pela globalização da consciência humana e pela globalização cooperativa e solidária, valorizadora da diferença e da diversidade, da tensão e da contradição, denunciadora do imperialismo cultural e dos seus efeitos descaracterizadores, torna-se de fato num progresso para a espiritualização ou eticização do mundo e das organizações, podendo aspirar-se então a uma democracia comunicativa global que assente num outro contrato social.

         Nesse sentido, críticas que atribuem ao multiculturalismo à exaltação da pluralidade cultural, mas o acusam de se omitir com relação às desigualdades estão, na verdade, sendo dirigidas a um sentido de multiculturalismo que, certamente, não é o único. O multiculturalismo crítico ou perspectiva intercultural crítica busca articular as visões folclóricas a discussões sobre as relações desiguais de poder entre as culturas diversas, questionando a construção histórica dos preconceitos, das discriminações, da hierarquização cultural. Entretanto, o multiculturalismo crítico também tem sido tensionado por posturas pós-modernas e pós-coloniais, que apontam para a necessidade de se ir além do desafio a preconceitos e buscar identificar, na própria linguagem e na construção dos discursos, as formas como as diferenças são construídas. Isso porque a visão pós-moderna, grosso modo, focaliza os processos pelos quais os discursos não só representam a realidade, mas são constitutivos da mesma.

         Ao lidar com o múltiplo, o diverso e o plural, o multiculturalismo encara as identidades plurais como a base de constituição das sociedades. Leva em consideração a pluralidade de raças, gêneros, religiões, saberes, culturas, linguagens e outras características indenitárias para sugerir que a sociedade é múltipla e que tal multiplicidade deve ser incorporada em currículos e práticas pedagógicas.

         No entanto, em uma visão essencialidade, a identidade é vista como essência acabada. Se a abordagem multicultural é construída sobre essa suposição, ainda que valorize a pluralidade de identidades, irá visualizá-las como entidades estanques: o negro, o índio, a criança, o adolescente, a mulher, o deficiente e assim por diante. É o caso, por exemplo, das perspectivas multiculturais folclóricas e daquelas que se baseiam em certas vertentes do multiculturalismo crítico, que ainda não incorporaram o caráter de construção das identidades, nem se voltaram ao papel dos discursos nessa construção.

         No caso do multiculturalismo, alguns autores tais como Bourdieu (1999) expressam o receio de que, sob o pretexto de defesa de identidades marginalizadas e, em muitos casos, da visão relativista, tal visão poderia estar criando novos universalismos e novos essencialismos identitárias. De fato, ao se referir às lutas indenitárias, Bourdieu (1999) aponta que, para se opor ao que ele denomina de universalismo hipócrita, os movimentos de subversão simbólica ligados a identidades coletivas (compreendidos como sendo multiculturais), podem terminar por construir guetizações e universalizar os particularismos (p. 148). De modo a superar esse perigo, o referido autor propõe que o potencial subversivo do que ele denomina de “movimentos particularistas (referindo-se, como exemplo, ao movimento homossexual e ao feminista), coloquem a serviço do universal, as vantagens particulares que [os] distinguem dos outros grupos estigmatizados (p. 149). Podemos exemplificar o caso de um professor que deseje trabalhar em uma perspectiva multicultural crítica pós-modernizada ou pós-colonial.

         Neste caso, uma ideia de atividade seria, por exemplo, propor tarefas que exijam crítica cultural, em que os alunos tentem identificar vozes silenciadas e/ou estereotipadas, em livros didáticos e outros materiais. Outras atividades são propostas por autores, incluídos em estudo organizado por Trindade & Santos (1999). Alguns autores sugerem atividades tais como pedir que meninos e meninas busquem a definição de mulher, de negro, de judeu, e outras identidades marginalizadas, no dicionário, vendo

estereótipos e/ou possibilidades de valorização dessas identidades, aí presentes.

         Após essas atividades de cunho multicultural crítico – que enfatizam as identidades coletivas de raça, gênero, etnia e outras silenciadas e marginalizadas – esse mesmo professor deseja ir além, de forma a sensibilizar os alunos para a hibridização identitárias, para as diferenças dentro das diferenças, de forma a não dar uma ideia de homogeneidade e congelamento identitário em torno do ‘negro’, do ‘índio’, da ‘mulher’ e outras identidades. Nesse caso, dentro de sua perspectiva multicultural crítica pós-colonial, poderia buscar outras atividades, que dirijam a atenção dos alunos a aspectos que fazem parte da construção de suas próprias identidades.       

         O multiculturalismo crítico pós-modernizado ou pós colonial traz, como mote, o compromisso com a desconstrução dos discursos que, ainda que comprometidos com a justiça e o desafio a preconceitos, ainda permanecem congelando identidades e demonizando o outro. Ideias referentes à avaliação da aprendizagem e à avaliação institucional multiculturalmente orientada (CANEN, 2004; CANEN, 2005), podem servir de inspiração para atividades avaliativas, levando em conta a diversidade cultural e o desafio a preconceitos.

         Da mesma forma, sensibilizar alunos para formas plurais de dar significado ao mundo, segundo percepções culturais diversificadas, não significa cair em um vale-tudo, um relativismo total em que quaisquer valores sejam aceitos de forma acrítica. Conforme se argumenta, a perspectiva multicultural que implica que um diálogo seja estabelecido entre valores éticos, humanos de preservação da vida e de respeito à existência do outro e aqueles valores plurais que são particulares a grupos e identidades específicas.

 

 

 

 

 

 

 

 

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