A espiã por Paulo Coelho
O livro A Espiã, livro de Paulo Coelho, é o tema do meu texto Meu Patrono Visto Por Mim. Sendo a primeira incursão de Paulo Coelho no romance “meta-histórico”, entre a ficção e a não-ficção, utilizando-se de personagens históricos e fatos reais, mas com livre voo da imaginação criadora, o livro é muito envolvente e tem a marca da novidade. Para mim, a novidade foi dupla, porque encontrei uma promoção da Amazon Audio Books, onde se cadastrando, pude ouvir o livro gratuitamente. Dupla novidade realmente, nunca tinha ouvido um livro nessa mídia.
A história gira em torno da vida e do mistério da atriz e dançarina Marguaretha Geertruida Zelle, mais conhecida como Mata Hari, a mulher que ousou ser uma mulher desinibida e livre numa época em que o comportamento feminino deveria ser recatado e estar a um passo atrás dos homens.
A narração, feita pela própria Mata Hari, é extremamente fluída e dá um tom entre o relato lamentoso e o relato saudoso. A lamentação é pela condenação ao pelotão de fuzilamento francês por traição ou espionagem e o saudosismo ou a saudade é pelos grandes momentos no mundo do sucesso parisiense como dançarina nas maiores casas de show.
Apesar do sucesso e da fama de Mata Hari na Belle Époque francesa, o livro não deixa de denunciar as superficialidades e as tragédias da vida das elites e do falso glamour das celebridades fúteis e ricos sem noção da própria estupidez e crueldade. A crueldade, aliás, atravessa toda a narrativa, do começo ao fim. Estuprada pelo diretor da escola na Holanda, sua terra natal, a protagonista casa-se com um oficial militar e parte para a Indonésia, onde sofre experiências sexuais horrendas com o marido. O “batismo de fogo” de Mata Hari tinha sido o suicídio de uma mulher desiludida com o amor e tomada pela profunda infelicidade de um mundo de aparências que desfere um disparo de pistola no coração, bem próxima de Mata Hari, numa festa na Indonésia. A partir daquele momento passou a ser a mulher que manipulava e usava os homens e não o contrário.
Mata Hari na França, sempre foi invejada e reconhecida como artista de dança oriental, no seu auge, mas nunca respeitada. A injustiça que se abateu sobre ela se dera por intrincados acontecimentos e “atividades suspeitas” que só foram consideradas suspeitas porque havia um contexto de guerra e um Tribunal de Guerra com a Lei de Segurança Nacional na França da 1ª. Guerra Mundial.
Tinha sido contatada pelo Cônsul Cramer da contraespionagem alemã e contratada para dançar em Berlim para a aristocracia, quando sua carreira já não tinha a mesma fama em Paris. Foi como encontrar o homem certo no lugar errado.
As acusações foram injustas realmente? Até hoje não se sabe, embora fique bastante claro que houve muito exagero, no mínimo, com relação às suas “atividades de espionagem.” Fiquemos com as palavras da própria personagem: “Sou uma mulher que nasceu na época errada e nada poderá corrigir isso. Não sei se serei lembrada no futuro, mas, caso isso ocorra, espero que me vejam não como uma vítima, mas como alguém que deu passos corajosos e pagou sem medo o preço que precisava pagar.”
O livro, no seu todo, demonstra a grande força do autor que brilha ao adentrar um extremo psicologismo e defesa da causa feminina e no universo pessoal da sua precursora Mata Hari, que entrara em outra dimensão, num transe místico em mistura de yoga e meditação ao assistir a dança sagrada e exótica na Indonésia.
No nosso tempo, Madona, a cantora pop, foi considerada a mulher do ano em 2016 e teve que fazer um discurso enorme de “justificação” – a rigor ela não tem que justificar nada – de seus atos, atitudes e pensamentos. Estaríamos tão distantes assim da época de Mata Hari?
Este texto foi publicado originalmente na AVL (Academia Virtual de Letras António Aleixo) como participante do programa Meu Patrono Visto por Mim, haja vista que o autor, Mauricio Duarte, é membro efetivo da AVL, na Cadeira 18 e tem como Patrono o referido escritor, Paulo Coelho.