Abuso sexual intrafamiliar atividade sexual entre uma criança e um membro imediato da família
Seabra (1999) caracteriza o abuso sexual com a prática de violência intra-familiar e extrafamiliar contra crianças e adolescentes. O abuso sexual intra-familiar é por ele definido como qualquer forma de atividade sexual entre uma criança e um membro imediato da família (pai, padrasto, irmão, mãe), extensivo (tio, avô, primo) ou parente substituto ( um adulto o qual a criança o considera como membro da família).
A maioria das meninas abusadas sexualmente confirma o relato de que o abusador é uma pessoa conhecida, isto é, o pai, o padrasto, o avô, o tutor ou parente próximo (AZEVEDO; GUERRA, 1989).
A família desempenha um papel de destaque neste processo, uma vez que constitui o primeiro sistema social no qual o ser humano em desenvolvimento interage. Além do provimento de bens, sustento, educação informal e preparo à educação formal, os cuidadores são responsáveis pela transmissão de valores culturais de diversas naturezas, tais como, religiosos, morais, tradicionais e acadêmicos. A dinâmica do grupo familiar é poderosa no desenvolvimento dos repertórios básicos de comportamento da criança. A família influencia o desenvolvimento do senso de cooperação e reciprocidade das crianças, quando se mostram sensíveis e responsivos às suas necessidades. Nesta perspectiva, o sentimento de pertencimento e a percepção de ser amada fortalecem a expectativa de apoio percebida e recebida dos cuidadores reduz a angústia da criança (BRITO e KOLLER, 1999).
O abuso sexual intra-familiar pode ser caracterizado pelo relacionamento interpessoal cuja pratica é efetuada sem que o consentimento seja considerado valido devido às implicações vinculadas às situações de coerção, poder e de autonomia de um dos agentes – criança e adolescente. Na maioria dos relatos, o abuso sexual além das praticas coercitivas, é associado ao abuso físico e psicológico/emocional (BRITO e KOLLER, 1999).
Entretanto, nem sempre os cuidadores comportam-se de forma protetora e as situações de risco experiênciadas pela criança podem ocorrer dentro do sistema familiar. Pesquisas apontam que 80% das ocorrências de maus tratos contra crianças e adolescentes são perpetradas no ambiente doméstico (OLIVEIRA; FLORES, 1999).
O perpetrador utiliza-se do poder, da relação de confiança e/ou forca física para colocar a criança e ou adolescente em situações para as quais não possui condições maturacionais biológicas e psicológicas de enfrentamento (FERREIRA; SCHRAMM, 2000, FURNISS, 1993).
Em geral, os perpetradores do abuso sexual intra-familiar são pais, os padrastos, os tios, os vizinhos, entre outros parentes. Apesar da maior incidência ser ocasionada por homens, estes não são os únicos. Mesmo que, “na violência sexual domestica, as vitímações ocorram no território físico e simbólico da estrutura familiar onde o homem praticamente possui o domínio total” (FERREIRA; SCHRAMM, 2000, FURNISS, 1993).
Os casos de abuso sexual em que o suposto perpetrador do abuso possui vínculo de parentesco com a criança ou o adolescente, e/ou mantém algum tipo de relação de poder expressa por seu lugar no espaço familiar (seja do ponto de vista hierárquico- pai, mãe e padrasto – seja do ponto de vista afetivo- tios e irmãos), são considerados como relação de incesto, principalmente pelo caráter de interdição em torno desses fatos (FERREIRA; SCHRAMM, 2000, FURNISS, 1993).
O abuso sexual intra-familiar é desencadeado e mantido por uma dinâmica complexa. O perpetrador utiliza-se de seu papel de cuidador e da confiança e afeto que a criança tem por ele para iniciar, de forma sutil, o abuso sexual. A criança na maioria dos casos não identifica imediatamente que a intenção é abusiva e, por esta razão não revela a ninguém. À medida que o abuso se torna explicito e que a vítima percebe a violência, o perpetrador utiliza recursos, tais como barganhas e ameaças para que a criança ou adolescente mantenha a situação em segredo. Este segredo é mantido, na maioria dos casos, por pelo menos por um ano (FURNISS, 1993, HABIGZANG; CAMINHA, 2004, DE ANTONI; KOLLER, 2000).
O adolescente percebe-se vulnerável, acredita nas ameaças e desenvolve crenças de que é culpado pelo abuso, sentindo vergonha e medo de revelá-lo à família e ser punida. Dessa forma, o adolescente adapta-se à situação abusiva para manter as relações familiares (COHEN; MANNARINO, 2000, GABEL, 1997).
Araújo (2002) assinala sobre esta reflexão quando se refere ao âmbito familiar, sobretudo à violência que é uma constante. Designada de violência intra-familiar, sobretudo, entre parentes próximos que podem ou não viverem no mesmo ambiente parental ou distante o que não impede a possibilidade de ocorrência da mesma.
Os relatos das vítimas revelam ameaças e agressões físicas sofridas durante o abuso sexual, bem como sentenças depreciativas utilizadas pelo agressor. Estas também referem testemunhar agressões físicas entre os pais e demais membros da família. A violência gera um ambiente, no qual predominam os sentimentos de medo e de desamparo que contribuem para que o abuso sexual seja mantido em segredo pela própria vítima e por outros membros da família que, em alguns casos conhecem a situação, mas não a denunciam (DE ANTONI; KOLLER, 2000, DONG et al., 2003, HABIGZANG; CAMINHA, 2004).
Em torno do abuso sexual se estabelece um clima opressivo que pode se manifestar aparentemente como representativo do “ar de cumplicidade e segredo entre a vitima e o abusador”, mas este fato se estabelece concretamente entre o abusador e um outro membro da família que sabe dos fatos “e finge que não percebe as ocorrências”, o que configura um verdadeiro “muro de silencio” intrafamiliar.” “O enfrentamento do problema do abuso sexual intrafamiliar de crianças e adolescentes é extremamente difícil, por seu caráter familiar, domestico, privado e criminoso(...). No Brasil a questão torna-se mais complexa devido à convivência policial, ao medo e silencio das vitimas e testemunhas, à impunidade do agressor” (CECRIA, 1997).
No entanto, é dentro do contexto familiar que ocorre a maioria dos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes, perpetrados por pessoas próximas, que desempenham papel de cuidador. Nestes casos o abuso sexual é denominado intra-familiar ou incestuoso (COHEN; MANNARINO, 2000).