CALÇADÃO
Nos calçadões das praias, as ondas escuras, pedras, seguem paralelas as ondas do mar.
Vou, como dizia Caetano, sem lenço, sem documento, nada no bolso ou nas mãos, pois não preciso.
As coisas sagradas, amadas e profanas trago no corpo, na alma e no coração.
Tantos amores, enganos, dores e sorrisos, quantidades diversas que, somados, são registros gerais: RG.
Estes impregnados na carne e na mente se fundem com meus pés
A pisar, tropeçar, seguros de si ou não, nestes calçadões.
Já repararam no maravilhoso azul do céu a enroscar-se, lá embaixo, com o mar?
De longe, vemos céu e mar se acabar na linha do horizonte.
No esplêndido azul que azuleja o dia.
È verão! Claro, só pode ser verão: estação do mar.
Quando as ondas, inquietas, lambem a areia.
Esta, seca, se rende as garras de espumas
A arranhar os finos grãos.
Não chora, menina! Esta é sua sina: ser grão de mostarda.
Depois recuam, carregadas de segredos, satisfeitas com as juras feitas.
Sim, o mar é um poeta.
Ao cair da noite, contam para a lua, amparadas pela negritude permitida pelo dia,
os segredos de uma pobre alma aflita
As estrelas se mostram indiferentes, pois de todos os segredos guardados e sofridos
Hoje tão bobos que ninguém quer saber.
De calçadão em calçadão, ondulo feito água salgada.
Vez ou outra, coisa rara, encharco de sal o calçadão das praias
Assim, sigo, ondulando e caetaneando: “Eu quero seguir vivendo, amor.
Eu vou
Por que não, por que não...”