Como Visitar a um Enfermo
Por Silva Neto
e-mail: joao.digicon@gmail.com
As visitas aos enfermos têm um caráter fraterno, humanitário e cristão, tanto que o próprio Jesus nos recomenda: “visitai os enfermos”. Quando se trata de estranhos o ato se torna louvável, sem o cunho daquela obrigatoriedade de quando se trata de parentes. Nos dois casos, entretanto, não deixa de ter sua fundamental importância que é a de se colocar no lugar do sofrimento do outro e oferecer-lhe seus préstimos, seu ombro amigo. Em geral as visitas são curtas, respeitosas, seguindo-se um ritual honroso pelo clima de dor, lamentos, preces e palavras de conforto e incentivos. Enfim, o que se deseja mesmo é a cura imediata do enfermo e que ele possa voltar às suas atividades normais, ao convívio amigo firme e forte.
No entanto, o relato da visita ao João, por ocasião de seu estado enfermo, deu-se de forma inusitada pelos seus familiares. Algo inédito, raro, incomum, insólito, diferente, extraordinário aconteceu.
João estava adoentado, ausente às festividades de fim de ano, às bebidas, comilanças, festejos, cumprimentos, convescotes, gargalhadas e alegrias comuns à época; mantinha-se reservado, acabrunhado, taciturno, lamentado os espasmos e alfinetadas de seu estômago ulcerado. João estava um bagaço! Acamado, a espera da conclusão de exames, mal medicado, só lhe restava aguardar no leito de sua casa.
Paciência!
Não fossem os cuidados de sua amável esposa e os constantes telefonemas de seus parentes e amigos, diria: um homem solitário e triste.
Mas, as visitas nada de acontecerem aumentando ainda mais o desespero do João que àquelas alturas, não suportava sequer segurar o telefone, deixando ao encargo de sua adorável esposa a missão de porta-voz dos seus queixumes. A proximidade das pessoas tornaria um alento diante daquele quadro funesto, no entanto nada de visitas até então. O que houve? Os amigos o esqueceram! Será?
Até que os parentes resolveram aparecer para uma visitazinha!
No clima de ano novo, quando, ainda, estamos carregados de todos os anseios e esperanças de um ano bom, eles resolveram improvisar uma visita ao João enfermo. Família avantajada, só de cunhados, filhos e netos, aproximadamente uns trinta, sem falar da sogra matriarca que veio dar um apoio moral espiritual ao genro.
Apartamento de casal, quando os filhos já tomaram seus rumos na vida, é pequeno. João e esposa não tinham ideia de quantos poderiam adentrar aquele minúsculo apartamento quando atendeu ao telefone: “estamos indo te visitar”!
Logo os que não conheciam a nova residência do João resolveram chegar primeiro. Ao aproximarem-se do endereço, ligaram: “acho que passamos da entrada”
Meu Deus! Pensou João...
Se houvessem passado da entrada, realmente, teriam que fazer um arrodeio quase inexplicável para pegar o rumo e chegar ao nosso prédio. Como Explicar ao telefone?
Sua esposa não tinha ideia de como orientar pelo telefone muito menos ir ao encontro deles e guiá-los.
O João, que se encontrava deitado. fica apreensível com a situação, mandando o seguinte recado: “mandem parar e permanecerem onde estão”! Eu vou até lá. Antes de qualquer recusa de sua esposa, João pula da cama, veste uma bermuda e uma camiseta, coloca seu velho quepe na cabeça, desce o elevador e caminha ao sol a pino dois quarteirões ao encontro das visitas. Chegando lá, suado e ofegante, entra no carro e guia o motorista até ao apartamento.
As ligações se sucederam a grande maioria dos visitantes perdida e sem rumo, o João teve que caminhar pra lá, pra cá, na avenida direcionando-os, orientando-os no estacionamento e no elevador até adentrarem todos ao seu apartamento.
Diante da façanha do João, todos estupefatos perguntavam-se: onde está o doente a se visitar?
Imaginavam um moribundo acamado, gemendo de dor com cara de ressaca da virada. O próprio João, sem se dar conta de sua situação, respirava e não sentia a úlcera fisgar em seu estômago como que fosse um milagre. Literalmente a visita havia tirado o João enfermo da cama.
Enquanto isso a parentela entusiasta, não com ar de visita a doente, mais parecia comemorar um aniversário, improvisando um almoço, com direito a Chester e tudo. Cada um trouxe um prato especial: torta, rocambole, pudim, sorvete, tudo que o enfermo não podia comer; sinal de que não vinham visitar doente algum e sim proporcionar uma grande festa.
É... A família Mendonça é assim!
A casa fervia. Já imaginaram num apartamento de quarto e sala serem acomodados quase trinta adultos e crianças?
Era gente sentada em sofás, ao chão, na cama, na cozinha, de pé... Além da algazarra e gargalhadas ao atualizarem seus papos.
O almoço ocorreu por toda à tarde naquela festa de arromba. As mulheres improvisaram um salão de beleza aproveitando-se da habilidade de uma delas que se dizia craque da chapinha.
O suposto doente, o centro das atenções, já havia conversado de tudo. Os assuntos já se esgotavam enquanto procurava a todo instante um local para acomodar-se, afinal, havia trabalhado em dobro para acomodar os convivas. Ao dirigir-se à sua cama, não viu nada mais do que seu quarto transformado em um salão de belezas.
Pode?
É mole?
Brinquem com uma visita dessas?!!!