DEVO, NãO NEGO - por Maria Estela Ximenes

DEVO, NÃO NEGO

 

- O senhor está dizendo que não é um caloteiro?

- Caloteiro não, devedor.

- E qual a diferença? Ambos definem o indivíduo que não está em dia com as suas contas.

- É simples, caloteiro é aquele que deve sem a intenção de pagar, o que não é o meu caso.

- O senhor está me devendo há meses, e continua fazendo compras!

- Eu não podia sair daquela loja sem comprar o tênis. Estava em oferta!

-  Como vai quitar todas as contas atrasadas?

- Vou pagando aos poucos. Afinal, o mundo não acaba hoje. Estou aguardando um aumento de salário. Acredito que o dinheiro extra dará para pagar as dívidas.

- Já  parou para pensar que a sua situação financeira é um desastre?

- Ah, não se preocupe. Uma das minhas estratégias é me desviar das cobranças.

- É mesmo? Quer dizer que quando as cobranças se tornam constantes, você resolve fugir?

- Exatamente, também evito abrir a correspondência ou atender ao telefone quando sou chamado pelo sobrenome.

- E não se considera um caloteiro?

- Sinceramente, sempre que eu realizo uma compra, a minha intenção é pagar pelo produto, mas muitas vezes não sobra dinheiro.

- Sabe o que eu acho? Que você é ardiloso e merece receber um corretivo por isso...

Assim que chegou em casa, a mulher assustou-se com a aparência do marido.

- O que aconteceu com o seu rosto? Sofreu um acidente?

- Ah, não se preocupe querida. Estava andando na rua, tropecei e bati com o rosto na calçada.     

Crônica do livro “Um pindaíba nunca está sozinho”

 

Publicada em 11/04/2014

 

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