ESCULTOR DE PAINÉIS, VERSOS E SENTIMENTOS
Desde muito cedo, o menino Hilton aprendeu a valorizar sentimentos que se vão cultivando e colhendo ao longo da vida. Em especial, o apego à famíla, aos amigos, ao lugar onde nascera e a todas as demais circunstâncias que povoam e costumam marcar o cotidiano dos seres humanos (pelo menos dos que, como ele, têm a sensibilidade e a sabedoria necessárias a de tudo fazer o competente registro).
Nascer no 12 de junho, o Dia dos Namorados, pode haver contribuído para que ele se tornasse um enamorado das artes de viver e conviver. Cercou-se de amigos entre tanta gente que conheceu, ricos e pobres, poderosos e fracos, fáceis e difíceis. Sua morada chegou a funcionar como pensão certa época, o que ampliou seu rol de histórias a contar.
Alguém sabe o que é Anta? Assim mesmo, com maiúscula. A anta, com minúscula, até crianças que mal esquentaram o banco escolar são capazes de dizer que se trata do maior mamífero brasileiro. Só quem transita muito pelo estado do Rio ou dispõe de contatos locais vai saber, no entanto, que aquele verbete designa uma cidade fluminense, e não o bicho homônimo. Na verdade, nem cidade Anta propriamente vem a ser, pois consiste em distrito do município de Sapucaia, RJ. Hilton apegou-se tanto à sua urbe de nascença que passou a autodenominar-se “o Anta”.
A verve artística, manifesta durante a juventude, desenvolveu-se e consolidou-se na fase adulta. Unindo seus dotes de poesia, carpintaria, pintura, mecânica e outras searas, passou a compor versos, ou melhor, a esculpi-los em madeira, pedra, metal, portais e paredes, levando a arte literária à terceira e seguintes dimensões. Montou criativos painéis para melhor ilustrar algumas de suas numerosas trovas.
Nesse proceder, ganharam projeção inimaginável para outro mortal pessoas e objetos os mais diversos. Alçados a estrelas pelo poeta antense, vêm percorrendo mais de um firmamento, à medida que se apresentam a crescente número de leitores. O simples bloco retangular de pedra, postado quase defronte à casa da mãe de Hilton, converteu-se no decantado palco de aprazíveis folguedos infantis e de memoráveis cenas de romance ali vividos. O pai, querido e admirado, entrou para a posteridade por seus serviços de dentista prestados à comunidade local nos tempos em que dentes e parentes não raro eram negligenciados e caíam no esquecimento (o filho não seguiu a profissão do pai, mas, por sua iniciativa, as netas deram continuidade à tradição familiar de prover tratamento dentário, principalmente em base benemérita).
Fios, enrolados ou não, cestas, garfos, quadrados, esferas, lampiões, ares condicionados, cães, gatos, nomes próprios, expressões corriqueiras e diferentes sensações, nada escapa ao atento assuntar e à fértil imaginação de quem se propõe a enfocá-los, discuti-los e até mesmo os recriar perante o mundo. Da curiosidade em resolver simples problema mecânico à de rever conceitos, personagens e situações, o escultor dirige seu cinzel mental aos mais variados casos e deles erige novas imagens e ideias em formato lírico, sem prescindir de boa dose de humor.
A casa do artista em Anta converte-se em atrativo cultural, tamanha a quantidade de obras que oferece: são paredes, cadeiras, mesas, árvores e muito mais, decorados com rimas, sentimento e inventividade. Assim como a Casa de Neruda, no Chile, a de Guggiari, no Paraguai, e outras mundo afora, o solar de Hilton constitui ponto de referência local e bem-vindo lembrete do quanto a arte faz crescer.
Apesar do amor à sua localidade, o poeta já cresceu além dela e vê-se obrigado pelo dom de sua poesia a viajar a outros logradouros, física ou espiritualmente. Hilton Alvine (seu nome completo) integra, por exemplo, a Seção Petrópolis da União Brasileira de Trovadores. Poderá, certamente, vir ainda a alçar outros voos logo que essa praga do vírus Covid-19 voltar a permitir a livre circulação.
Para concluir esta ode a quem merece, transcrevo um de meus favoritos dentre os versos do escultor/poeta de Anta:
“Todo início tem partida,
Todo final tem chegada.
Necessário é na vida
Fazer bem a caminhada.”
Felicitações pela caminhada tão bem feita que você vem conseguindo, Campeão! É como ele gosta de chamar os amigos e eles costumam chamá-lo também, em fraternal reciprocidade.
Valeu, meu primo!
P.S.: quem se interessar, pode buscar Hilton Alvine, Quadros, Versos & Miscelânea, Editora do Autor, Ponte Nova, MG, 2013.
Acerca da cidade-musa de meu primo, escrevi “Nos tempos do Anta” (Afinal de Contos..., editora Illuminare, Torres, RS, 2019).