FRASES DE EFEITO
Na véspera do fato ocorrido, havia acabado de receber, de um amigo, um convite para escrever numa coluna de jornal . Este fato muito me honrou, embora o Projeto não tenha ido para frente! No dia do convite formal, encontrava-me numa cidade do interior, próxima a meu município. Combinamos retomar o assunto no próximo dia, no meu retorno (grande retorno!).
Aqui, inicia-se a história...
Minha passagem de ônibus já havia sido comprada com antecedência, e levaria apenas 01h30min, para chegar em casa e tomar diversas providências, antes de ir ao trabalho. Isso no “plano teórico”, desconsiderando a Lei de Murph.
Ao chegar à Rodoviária, quase fui atropelada por um ciclista que vinha na contramão da calçada.
Minhas bolsas estavam do lado de fora da linha fronteiriça do espaço compartilhado, o que me aliviou um pouco.
Ao passar por mim, o ciclista disse em tom ameaçador:
_Que azar!
Pensei na intenção da frase:
“Azar para quem?”
Há, exatamente, um ano fui arrastada por cerca de um metro, por um jovem ciclista, que tentou me assaltar, no horário de almoço. A palavra “azar” soou-me muito mal e aplicava-se aos dois personagens naquele momento.
Segui meu destino, pensando no que o garoto me disse, mas como não sou supersticiosa, imediatamente, puxei o refrão de uma música de Gilberto Gil, que, particularmente, amo:
“Andar com fé eu vou... que a fé não costuma faiá...”
Realmente, a fé não costuma falhar e “azar” é uma palavra que não faz parte de meu vocabulário...
Então... Tudo bem!
Por azar ou “não”, esperei o ônibus intermunicipal por 0h40min e já havia uma troca de olhares impaciente entre os passageiros.
Quando o desejado veículo aproximou-se, enfrentamos um pequeno probleminha: catraca automática recém- instalada.
Isso explicava, em parte, o atraso. Muitos passageiros, como eu, ainda estavam se adaptando aos procedimentos.
“Não basta ter que dançar ‘Macarena’ em frente à torneira automática, ainda temos mais essa?! Coreografar passos de tango, para entrar em ônibus intermunicipal?! Viver, realmente, está ficando complicado!”
_ Mãos para cima, encoste o cartão, abaixe um pouquinho...
Nossa! Parecia até uma simulação de assalto, mas deixe para lá!
Consegui entrar! Para variar, um cidadão ocupava minha poltrona. Sem problemas! Já estou acostumada!
Por incrível que pareça, o ônibus não estava lotado!
Prontos para partir?!
Lógico que não!
Uma madame e sua digníssima irmã, viajavam com um garoto, menor de idade (membro da família).
Pelo menos no Brasil e acredito que, em muitos países desse mundo, a lei obriga o porte de autorização judicial, para quem viaja com crianças, adolescentes ou jovens menores de idade... e quem disse que as duas compreendiam a situação do motorista:
_ Mas, senhoras... é lei! Se o Gerente da Rodoviária me autorizar por escrito, com certeza, liberarei a viagem de vocês.
O bate-boca durou mais uns 0h30min e os passageiros (incluo-me!) estavam incomodados.
Enquanto as senhoras argumentavam, plausivelmente, dava até para sentir certa compaixão! Uma delas teria que trabalhar e embarcar imediatamente. A outra ficaria com o menino, esperando alguém da família, com a bendita autorização judicial.
De repente, a que teria de embarcar, “jogou por terra” todos os seus argumentos civilizados e travou uma discussão arrogante com o motorista, que apenas cumpria ordens. Dentre todas as “ frases de efeito”, a que a moça proferiu quebrou toda e qualquer “mínima” compaixão dos espectadores.
_ Você sabe com quem está falando? (famosa “frase de efeito”, que nenhum efeito causa, a não ser irritação!). Todos se entreolharam, pois não sabiam quem era a criatura. Seria uma artista famosa? Teria recebido o Prêmio Nobel? Era parente de Gandhi, ou de Madre Teresa de Calcutá?
Não! Ninguém sabia com quem o motorista estava falando? Nem ela sabia quem era e com quem estava falando, mas continuou:
_ Minha irmã não é uma qualquer, não! Ela é dentista, tem faculdade (hummmmmmmmmmmmmmm!). É estudada, é cidadã!
Como se os analfabetos não fossem cidadãos! Como se nós, passageiros, e o motorista também não fôssemos cidadãos!
Enfim, para encerrar este tratado, tenho que mencionar que me lembrei de uma antiga personalidade famosa em minha região (Que Deus o tenha!)... Certa vez, ele me aprontou uma confusão, por ocasião de um evento que eu coordenava...
Na época, a regra para entrada gratuita, era simplesmente a utilização de um crachá identificativo. Esta regra se aplicava a autoridades, jornalistas... público em geral. A utilização do crachá não era uma Lei, mas era uma regra, uma condição para a entrada... Como coordenava 70 monitoras, orientei-as a respeito das condições e todas cumpriram fielmente a orientação... Cumpriram tão bem, que uma delas chegou-me chorando, dizendo ter sido humilhada pelo TODO PODEROSO, que engrossou a voz lhe disse:
_ Você sabe com quem está falando?! (Xiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii)
Coitada! Ela conhecia a voz, mas não o ser humano em carne e osso!
_ Eu sou o TODO PODEROSO e você é uma funcionária de última categoria (Ele caprichou nas frases de efeito, para fazê-la sangrar na alma!)
Chorando, a funcionária contou-me o deprimente caso. Tentando utilizar frases de efeito positivo, disse-lhe carinhosamente:
_ Não ligue! Ele não sabe qual é sua ínfima posição no UNIVERSO! Ponha um sorriso no rosto e tente esquecê-lo!
Não sei se a frase surtiu muito efeito, mas minimizou a situação.
A esta altura do campeonato, vocês devem estar se perguntando:
_Esta crônica não tem fim?
Tem sim, queridos! Conseguimos embarcar, cheguei atrasada, mas não perdi a crônica. Apesar da frase negativa do ciclista: “Que azar!”, acho que tive muita sorte, pois ganhei uma crônica!
Esta é para você, amigo do outro lado do oceano, que me deu muita sorte e para deixar a marca do brasileirismo, ressalto que, após algum tempo do ocorrido, vi uma maritaca me encarando do beiral de uma casa.
Acredito que adivinhei sua frase de efeito, caso pudesse falar:
_ Ei, seres racionais?! Vocês sabem com quem estão falando! Ha... ha... ha... Rir para não chorar!
MIRIAN MENEZES DE OLIVEIRA