História da Sexualidade embasadas em análises de Michel Foucault ao pensamento presente no feminismo - por Fabiana Juvencio

História da Sexualidade embasadas em análises de Michel Foucault ao pensamento presente no feminismo - por Fabiana Juvencio

História da Sexualidade embasadas em análises de Michel Foucault ao pensamento presente no feminismo

 

Em a História da Sexualidade – volume I, Foucault formula cinco aspectos que definem poder: (1) o poder não é algo que se adquira, arrebate ou compartilhe; algo que se guarde ou deixe escapar; o poder se exerce e só existe como ato/ação; (2) as relações de poder não são exteriores a outros tipos de relação (econômicas, de conhecimento, sexuais), mas lhe são imanentes, desempenhando papel de reprodução dessas relações; (3) o poder não é algo que parte de um ponto central, exterior e emana de forma descendente sobre a sociedade. O poder é algo que se produz e reproduz nas relações entre as pessoas, cujas relações desenham campos de força, móveis e desiguais. É essa desigualdade que induz a “estados de poder”; (4) o poder é onipresente, está em toda as partes não porque engloba tudo, mas porque nasce de todos os lugares, se produz a cada instante, em toda a relação entre um ponto e outro; (5) onde há poder há resistência. Esses pontos de resistência móveis e transitórios, que introduzem na sociedade clivagens que se deslocam, rompem unidades e suscitam novos reagrupamentos. (FOUCAULT, 2001: 89-92).

Foucault (2001) argumenta que parte da rejeição ao pensamento presente no feminismo deve-se a leituras particulares sobre sua obra, ou a determinados períodos de sua obra. Uma das críticas presentes entre as teóricas feministas é de que a microfísica do poder, como proposta por Foucault, permite entender como as relações se estruturam no cotidiano, mas não permite explicar as estruturas globais de dominação. “Esse tipo de crítica indica falta de familiaridade com o trabalho de Foucault sobre governabilidade (...) Foucault não nega que as práticas microfísicas de poder sejam tomadas de estratégias globais ou macro estratégias de dominação. Ele apenas recusou o privilégio de um centro de poder, o qual é visto permeando a vida cotidiana das pessoas.” (p. 43, 44).

Violência de gênero, nesse estudo, não fundamenta-se nas diferenças dos sexos dos envolvidos, mas embasa-se nas relações entre homens e mulheres em situações intimas.  Para tanto, o uso da justiça e do exercício do poder. As principais contribuições da pesquisa, deve-se a classificação dos fatores que aparentemente estavam presentes na maior parte das agressões definidos como fatores condicionantes (opressão socioeconômica; discriminação da mulher na família, na justiça, etc.; a ideologia machista; educação diferenciada; representação das relações entre os sexos) fatores precipitantes (álcool, tóxicos e estresse), concluindo que nenhum destes fatores pode ser apontado como causa unívoca da violência, podendo contudo influenciar em sua ocorrência para Azevedo (1985). A autora sugere que a violência contra a mulher é de natureza sexista, “(...) um exercício perverso da dominação do macho sobre a fêmea” (AZEVEDO, 1985: 24) e defende uma visão pautada no modelo dominação-submissão que atribui à mulher o papel de vítima e ao homem a responsabilidade pela violência. Nessa abordagem haveria poucas oportunidades de libertação da mulher, uma vez que em nenhuma situação ela seria capaz de se manifestar contra o poder masculino de cordo com o mesmo autor.

Destaca-se o artigo de Marilena Chauí Participando do Debate sobre Violência Contra a Mulher (1984). A principal referência extraída deste trabalho é a definição de violência, segundo a qual as diferenças seriam convertidas em desigualdades, servindo desta forma à dominação, exploração e opressão dos homens em relação às mulheres. Segundo sua hipótese, “a subjetividade feminina seria constituída heteronomamente, ou seja, externamente às mulheres, através de um discurso masculino que é entendido não só como aquele que fala sobre as mulheres, mas como aquele cuja existência é possível graças ao silêncio delas” (CHAUÍ, 1984: 45).

Em relação a violência contra a mulher, Bárbara Soares (1999) refere-se ao fascínio que cifras e números exercem sobre aqueles que se dedicam a analisar o problema da violência contra a mulher. Seu exemplo é norte-americano, mas pode ser aplicado a qualquer sociedade. Soares relaciona uma série de números e porcentagens que são utilizados em panfletos e campanhas que visam estimular o combate à violência contra a mulher e alerta para o perigo em se destacar os números do contexto e da lógica em que foram produzidos, sejam pesquisas acadêmico-científicas, sejam instituições de segurança e justiça ou de outra natureza, revelando dados que são contraditórios, que muitas vezes sustentam ideologias, mas nem sempre refletem a realidade.

Saffioti (2002) reforça a idéia de que os estudos e estatísticas revelam apenas parte da violência contra a mulher, pois cada instituição ou tipo de pesquisa, polícia, sistema de saúde, pesquisa com a determinada população – revelará sempre apenas parte dos casos. “Existe uma maneira extremamente cara, tanto do ponto de vista financiero quanto daquele do tempo, de obter esses dados – passar a sociedade na peneira, ir de casa em casa perguntando quem ali sofreu violência e por parte de quem. Ainda assim, não saberíamos quantas mulheres realmente sofrem violência, porque muitas esconderiam o fato do pesquisador.” (p. 35).

Tratando das dificuldades para conceituar a violência doméstica, violencia familiar ou a violência contra a mulher e suas especificidades, Soares (1999) coloca que “(...) queimar uma mulher ou feri-la com uma arma, estuprar uma criança e forçá-la a práticas sexuais são atos facilmente incrimináveis, legal e moralmente, ao menos nas democracias modernas. Outros itens são, contudo, menos óbvios, como xingamentos e palavras que ferem e, sobretudo, o ato de privar um parente de suas necessidades básicas (...).” (Soares, 1999, 69). Ainda segundo esta autora, na sociedade norte-americana, essas outras formas de violencia estariam sendo classificadas como abusos e negligências. Se por um lado, a definição de violência relacionada a atos que provocam dor física é limitada, excluindo os abusos de ordem emocional, por outro lado, a inclusão da negligência, omissão, ameaça verbal e xingamentos como violência não é menos problemático pois, como ressaltou Soares “a intensidade das ameaças e o poder que as palavras tem de ferir uma pessoa dependem do contexto em que são proferidas e da dinâmica de cada relação”. (1999, 71).

Este tema do vínculo afetivo entre mulheres e agressores também reaparece nos debates a respeito da adequação da lei 9099/95 aos casos de violência contra a mulher, especialmente com relação à definição dos crimes como de “menor potencial ofensivo” (MASSULA, s/d; MELO e TELESe, 2002). Argumenta-se que o poder ofensivo de uma agressão entre marido e mulher tem uma profundidade que não pode ser captada pela esfera jurídica por ser subjetiva, ferir as emoções e sentimentos. Essas questões afetivas e morais não são passíveis de mensuração ou de serem convertidas em laudos. Sua concretude não é passível de objetivação e materialização. Daí a dificuldade de se estipular penas ou medidas punitivas que visem a reparação de danos à vítima.

Em uma perspectiva teórica, a origem da violência contra a mulher tem sido, de modo geral, explicada como conseqüência natural e universal das diferenças biológicas entre homens e mulheres (O’TOOLE & SCHIFMANN, 1997). Sob a ótica de gênero, essas diferenças biológicas passaram por um processo de apropriação pela sociedade, de modo que a prática da violência de homens contra mulheres tem origen na adequação ou inadequação aos comportamentos e valores inerentes aos papéis masculino e feminino vigentes em cada sociedade (CORRÊA, 1983). Desta forma, sempre que a mulher deixa de se comportar como seria esperado para seu papel (como esposa, como mãe, como amante, como dona-de-casa) a violência pode ocorrer.

As conclusões do Relatório Mundial sobre Violência e Saúde (KRUG, 2002) corrobora a existência dessa tensão na compreensão dos fatores que estão presentes na violência contra a mulher. Segundo o relatório, recentemente surgiram esforços em estabelecer quais são os fatores de risco de violência contra as mulheres. Foram analisados fatores individuais (histórico pessoal e personalidade), fatores de relacionamento (companheirismo) e fatores comunitários (econômicos e respostas coletivas ao problema). As primeiras conclusões indicam que o único fator que indica risco para as mulheres trata do histórico de violência na família, ou seja, os índices de abuso parecem ser muito maiores entre as mulheres cujos maridos foram vítimas ou testemunharam episódios de violência familiar quando crianças. Sobre o uso de álcool pelos agressores, embora sua freqüência seja elevada nos relatos de violencia contra a mulher, de acordo com o relatório, não foi possível ainda establecer sua magnitude como risco para as mulheres, uma vez que não há consenso se a relação entre álcool e violência é causal. “Muitos pesquisadores acreditam que o álcool funciona como um fator situacional, aumentando a probabilidade de violência ao reduzir as inibições, anuviar o julgamento e coibir a capacidade das pessoas de interpretar os sinais. O excesso de bebidas também pode aumentar a violência de gênero ao estimular as brigas entre os casais. Outros argumentam que o vínculo entre a violência e o álcool depende da cultura e existe apenas em cenários onde a expectativa coletiva é de que a bebida causa ou justifica determinados comportamentos. Na África do Sul, por exemplo, os homens falam em usar o álcool de forma premeditada, para ganhar a coragem necessária para bater em suas parceiras, como acham que é socialmente esperado deles.” (KRUG, 2002: 99).

Entretano, em estudos brasileiros relizados sore a violência contra a mulher, também se encontra a referência à presença do álcool nas agressões. Azevedo (1985) já propunha que o álcool fosse considerado como fator que precipitava a violência, e não como determinante para sua ocorrência. Outro estudo que abordou a questão da presença do álcool e das drogas nas ocorrências de violência contra a mulher (SOARES et al., 1996) ressalta que além das relações de causalidade que são estabelecidas entre álcool e violência, é preciso pensar a respeito da expressão que isto tem na forma como as mulheres constroem seus relatos e elaboram a experiencia pela qual passaram ou vem passando. “Definir o agressor como alcoólatra ou embriagado envolve, sem dúvida, uma acusação. Mas a bebida funcionará como agravante em alguns casos e como atenuante em outros, dependendo dos rumos que tomará o “diálogo” disruptivo ou conciliatório que a vítima estabelece com o agressor e para o qual convoca a mediação da delegacia. Em qualquer um dos casos, contudo, a presença do álcool não fará mais do que acentuar ou minimizar o teor da violência. Nenhum delito se sobrepõe à violência já denunciada: beber não é ilícito.” (SOARES et al, 1996: 88, 89).

 

 

 

 

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