Igreja e socialismo - por Antonio Eustáquio Marciano

Igreja e socialismo - por Antonio Eustáquio Marciano

Em 15 de maio de 1891, o papa Leão XIII publica a Carta Encíclica RerumNovarum, o documento mais importante da Igreja Católica, que fala das condições dos operários e sobre a justiça social no mundo novo de então. Estedocumento, o mais reevocado e atualizado por outros escritos oficiais, entre outros pontos fundamentais, reconhece o direito dos operários de defenderem, em conjunto, seus direitos, formando associações profissionais.Contudo, o documento, clara e enfaticamente, rejeita o socialismo ou social democracia, condena a luta de classes e defende os direitos à propriedade privada. Discute as relações entre o governo, os negócios, o trabalho e a Igreja. São questões de ética e direitos humanos, tratados naqueles tempos de grandes mudanças. Mudanças estas que aconteciam, principalmente, ante as ideias que se desenvolveram após as publicações dos escritos de Karl Marx e Friedrich Engels, no período da Ordem da Revolução Industrial, preocupados em analisar o modo de produção capitalista.

 A Igreja, em muitas partes do mundo, passa a ser grande motivadora e orientadora na formação de associações de operários, visando ao fortalecimento desta classe, para reivindicar boas condições de trabalho, em diálogo constante com os donos do capital, tudo sob a luz do Evangelho e da Doutrina Social Cristã (DSC).

No Brasil, este trabalho foi feito por diversas instituições e entidades, entre elas as Comunidades Eclesiais de Base (CEB) e os Círculos Operários.  A maioria delas foi conduzida por pessoas que acreditavam na possibilidade de haver uma sociedade onde prevalecesse a justiça e a paz social.

Trataremos aqui, rapidamente, dos Círculos Operários, que são instituições sociais leigas, de utilidade pública, sem fins lucrativos, voltados à promoção do ser humano e de suas comunidades, buscando a Justiça Social Cristã. Até alguns anos, tinham em sua diretoria, um membro responsável pela aplicação da DSC, com aprovação do bispo diocesano. Isto foi abolido em alguns Círculos, Brasil afora. Os Círculos advogavam as causas comunitárias a extremo de suas possiblidades e recursos. O primeiro Círculo foi fundado em 1932, em Pelotas (RS), pelo padre jesuíta Leopoldo Brentano, com a finalidade de apoiar os trabalhadores, ainda longe dos benefícios necessários a uma vida digna. Surgem do envolvimento entre a Igreja Católica e o Estado, no Brasil, entre 1930 e 1964 e resultam do papel desta relação no mundo do trabalho e no processo de desenvolvimento urbano industrial. São os Círculos Operários uma das vertentes do catolicismo social que, obedecendo a encíclicas e documentos da Igreja, fixa as bases para que esta instituição sustentasse seu ideário de harmonia social, progresso e ordem, essenciais para sua atuação no projeto de normatização do trabalho no Brasil. A organização circulista foi o projeto politico-teológico e instrumento da Igreja Católica para sua inserção no mundo do trabalho. Na historiografia e matizes da experiência circulista, em diferentes espaços, forjou-se um projeto pedagógico compreendido na dimensão de um trabalho voltado para a instrução e doutrinação dos trabalhadores em seus espaços diversos. O período revolucionário brasileiro foi época de incertezas para a instituição, o que acabou por torná-la inerte, em muitas partes do Brasil, até a concretização da redemocratização.

Hoje, muitos católicos de verdade estão aflitos por causa de opiniões, em materiais diversos, que circulam em redes sociais, com grandes questionamentos e até agressões à Igreja, com acusações de que ela apoia as ideias e práticas socialistas no Brasil. Isto é perfeitamente compreensível, pois que, a Igreja sempre teve a sua ala com tendência socialista, principalmente após o advento da teologia da libertação. Como dito acima, já nos fins do século XIX, ela se envolveu muito na ajuda aos trabalhadores a se organizarem, notadamente após a Revolução Industrial, reconhecendo o direito destes de se organizarem em sindicatos.

Entretanto, pelo que pude observar, apesar de existirem alguns comunistas na Igreja, isto não pode significar que ela esteja toda tomada por esta ideologia.O maior problema, na minha opinião, é a ignorância de muitos de nós católicos e até de uma parte do clero, por não conhecerem totalmente as fartas orientações oficiaisde Roma, pois é uma instituição católica, apostólica, com sede na capital italiana, além disto é um estado, o Vaticano. Como em qualquer instituição que trabalha para o bem comum, também na Igreja existe infiltração de adversários e inimigos. Acredito que a Igreja Católica no Brasil é ainda muito forte, tem muita credibilidade e, o mais importante, tem a assistência do Espírito Santo.

O Brasil, penso, está mais carente de boas escolas do que de qualquer igreja. Precisamos orar, laborar e estudar, não necessariamente nesta ordem. Qualquer crise pode ser resolvida com diálogo. Toda verdade pode ser encarada com espirito fraterno e fidelidade evangélica.Os Círculos Operários são exemplos de instituições importantes que, passado o tempo de um tipo de ação útil, buscaram outras formas de servirem à sociedade.  Se as crises têm um lado bom, pode se dizer que é a hora em que as pessoas se revelam.

 

 

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