por Giuliano de Méroe
Marcos de Andrade Filho nasceu no Recife, no dia 23 de junho de 1982. Filho de Marcos Antonio Soares de Andrade e de Etiene da Silva Andrade, teve sua formação básica com os Irmãos Maristas, no antigo Colégio da avenida Conde da Boa Vista, no centro do Recife. Aos catorze anos de idade, começou a interessar-se por Literatura. Também são desta época seus primeiros poemas. Em 1999, foi levado pelos Maristas a Lyon (França) e Roma (Itália) para presenciar a canonização do padre Marcelino Champagnat, celebrada pelo então papa João Paulo II. Ingressou no curso de Letras da Universidade Federal de Pernambuco e depois na Universidade de Brasília. Começou a lecionar Língua Portuguesa e Literatura Brasileira na rede particular de ensino, tendo passagem, nessa área por cidades, como Recife, Jaboatão dos Guararapes, Abreu e Lima e Campina Grande. É sócio proprietário da empresa Edu & Marcos – Curso de Linguagens, em parceria com o professor Edu Letras. Fundou e foi o primeiro presidente do Rotaract Club de Paulista - Janga. Lançou seu primeiro livro “Não Lugar” (Ed. Bagaço) em 2005, participou de diversas antologias e recebeu vários prêmios, denstre os quais o Prêmio Edmir Domingues, da Academia Pernambucana de Letras, pelo livro “Spollivm” (Ed. UFPE, 2012). É membro da União Brasileira de Escritores e da Academia de Letras do Brasil.
“E essa realidade me diz que eu não posso fazer nem da literatura nem da educação algo diferente do que elas são: atividades profissionais exaltadoras do gênero humano e que, como tal, devem ser respeitadas, amadas, exaltadas, desejada e muito, muito, muito bem pagas!”
Boa Leitura!
Divulga Escritor - Escritor Marcos é um prazer contarmos com a sua participação no projeto Divulga Escritor. De modo geral, como você enxerga o ambiente acadêmico no Brasil, no campo da Literatura?
Marcos Andrade - O prazer é meu em poder colaborar com este belíssimo projeto de divulgação da produção literária nacional que é o “Divulga Escritor”. Bem, podemos dividir o que você chama de “ambiente acadêmico” em dois ambientes, na verdade. Vou chamá-los de “o universitário” e “o artístico”. Naturalmente, me parece desnecessário apontar, aqui, as diferenças basilares entre eles, afinal, todos sabemos que ser “acadêmico” na Universidade Federal de Pernambuco é uma coisa, já sê-lo na Academia Pernambucana de Letras é outra. Em ambos, percebo que, na última década, tem havido uma abertura paulatina, mas relevante para a comunidade, em especial para os jovens escritores. Creio que tanto a Universidade quanto as Academias de Letras têm caminhado no sentido de extirpar de seu seio um velho ranso que não poupava críticas, muitas vezes, deletérias aos mais jovens e aos iniciantes. Isso é um sinal alentador dos tempos, pois revela que o “sangue novo” tem qualidade e uma qualidade digna de reconhecimento, tanto no meio universitário quanto no artístico.
Divulga Escritor - Que impressões ou sentimentos o convenceram a ser professor de Literatura brasileira?
Marcos Andrade - Eu tive excelentes professores na área de Linguagens nos tempos de Ensino Médio e, depois, na graduação. Além de grandes mestres na área das Letras eram exímios e abnegados educadores, dos quais me tornei, com orgulho, um colega de professão que, até hoje, neles se inspira. Não há dúvidas que, com os exemplos que tive, ficou relativamente fácil encontrar minha vocação. Ademais, sempre me fascinou a ideia do papel social que eu teria no meu país e no mundo. Eu estaria, para usar uma alusão castroalvina, semenado livros a mão cheia e mandando o povo pensar. Ter nas minhas mãos esse poder transformador me encheu de medo e de esperança. Era poder demais nas mãos de um professor mal saído da adolescência! Mas a ideia de perpetuar minha paixão pela Literatura e forjar sujeitos ativos, construtores de suas histórias e da História do mundo me deu a coragem que, graças a Deus, conservo e alimento até hoje.
Divulga Escritor - Como poeta e professor, você sente cumprir com alguma missão individual?
Marcos Andrade - Interessante essa pergunta. De cara, me vem a vontade de responder seguindo um viés ideológico, sentimental, quase idealizado e utópico de tão romântico e dizer: Claro! Faço parte dos “gênios da raça” e minha missão é de todas a mais sublime! (risos). E, sinceramente, tirando os ares de pedantismo que essa resposta naturalmente possui, eu não estaria mentindo! (risos). Mas, sendo mais modesto, é preciso que se diga que, tanto como professor, quanto como poeta, eu sou um profissional e estou convicto de que profissionais têm uma outra missão: a de zelarem pela profissionalização perpétua de seus ofícios. Ver o papel social do professor e do poeta reconhecido, respeitado, engrandecido, dignamente remunerado, desejado pelas novas gerações são também missões minhas. Há quem faça literatura e educação por mero “sonho”. Eu também faço! Mas meu sonho tem os dois pés fincados no chão prático da realidade. E essa realidade me diz que eu não posso fazer nem da literatura nem da educação algo diferente do que elas são: atividades profissionais exaltadoras do gênero humano e que, como tal, devem ser respeitadas, amadas, exaltadas, desejada e muito, muito, muito bem pagas!
Divulga Escritor - Você deixa transparecer um senso de justiça em relação aos fazeres de “educar” e de “escrever”. Foi esse senso de justiça que o levou à Faculdade de Direito?
Marcos Andrade - Talvez tenha sido. Sempre acreditei que a Ciência do Direito seria fundamental ao aprofundamento de meu exercício da cidadania. Há uma promessa divina que garante saciedade àqueles que têm fome e sede de Justiça. Por mais utópico que seja esse ideal, o homem é pouco ou nada sem suas utopias. Espero que, como jurista, meu discurso ganhe um novo poder: o poder de construir a verdade possível. Enquanto eu tiver fome e sede de minhas utopias, tenho em vista, pelo menos, a recompensa que os céus me garantem!
Divulga Escritor - Você disse que a Literatura é “exaltadora do gênero humano”. Como a Literatura pode ajudar, por exemplo, no pensamento humano?
Marcos Andrade - Ezra Pound dizia que não há literatura que se produza no vácuo e Otto Maria Carpeaux completava dizendo que a literatura existe, sim, no tempo e no tempo histórico. Por meio da literatura, entramos, de um modo especial, em contato sensível com nossa história. A arte literária nos permite compreender de modo crítico e sensível nosso tempo e a trajetória da coletividade (sociedade) a que pertencemos no tempo, no transcurso da história. A identidade histórica de um povo, traduzida, transcriada artisticamente por meio da história de personagens, por meio do pensamento, dos sentimentos, das experiências de vários “eus” tocam os leitores que interagem com os textos literários e levam esses leitores a repensar a própria história e a história do povo a que pertencem. Talvez por essa razão Pound dizia que, quando a literatura de um povo chega a enfraquecer, definhar e morrer, é sinal de que a nação, o povo que produz tal literatura já havia morrido muito antes. Isso é possível porque a literatura, sendo produto da sensibilidade de um ser humano inserido em um contexto complexo, que envolve história, sociedade, cultura, religião, tradições, ideologias, etc., permite que se revelem como pensavam e sentiam os seres humanos em diversas épocas históricas. Linguagem, hábitos, costumes, valores são registrados por meio da recriação literária da realdade e, como a literatura é uma arte e a sensibilidade é um traço universal do homem, esses “registros” transcendem a barreira espaço-temporal e chegam até nós. Resultado: Literatura entretém, diverte, denuncia a realidade, dá prazer, faz refletir, humaniza, enfim, dialoga com tudo aquilo que diz respeito ao homem! Se isso não forma e transforma o que você chama de “pensamento humano”, eu realmente não sei o que é capaz de fazê-lo! (risos)
Divulga Escritor - Você tem vários livros de poesia publicados, que temas você aborda em seus textos poéticos?
Marcos Andrade - Percebo que, em minha poesia, transitam temas que não são excluivamente meus, mas de toda a nova geração da poesia contemporânea nacional – refiro-me aos poetas que surgiram nas décadas de 1990, 2000 e 2010. Revelamos em nossa produção influências da poesia marginal dos anos 1970; nos apropriamos de um lirismo marcado pela espontaneidade; relemos crítica e reverencialmente as grandes influências do passado recente da poesia nacional, especialmente Bandeira, Drummond e Cabral; buscamos, guaidos por uma vontade de forma, incessantemente pesquisar formas de expressão poética e cuidar de encontrar uma linguagem que diga de nosso tempo, de nosso “ethos”; realizamos experimentos que vão às raias da ousadia mas que definem esta encruzilhada de padrões, linguagens, perfis que é a pós-modernidade, entrecruzando poesia e música, poesia e vídeo, poesia e internet, poesia e fotografia; mergulhamos, enfim, em temas que vão da vida nos grandes centros urbanos, passam pela poetização da grande ciência da atualidade e chegam mesmo à regressar à eterna discussão de todo poeta: a metalinguagem. De tudo isso que meus coetâneos fazem faço também eu um pouco de tudo. Recentemente, minhas relações com Deus e com meus filhos, Marcos Emanuel e Mel, que são meus dois melhores poemas, têm povoado bastante minha produção.
Divulga Escritor - De forma geral, como escolher um bom livro poético para comprar, e o que os diferenciam? Qual deles você recomenda
Marcos Andrade - Pergunta difícil! (risos). Acredito que não há receita pronta para essa escolha. O leitor pode construir seu próprio caminho na base da tentativa e erro. Eu procuro sempre pesquisar antes, conhecer o autor, ler algo esparço de sua produção e buscar adquirir a obra. Mas esse é apenas o caminho que eu trilho. Não é universal. Gosto da ideia de se aventurar numa livraria e comprar um ilustre desconhecido que, não raro, se converte numa agradável surpresa! Dizem que nunca se deve comprar um livro pela capa, mas, sinceramente, há capas fascinantes que envolvem obras de igual fascínio. Lançar-se a esse risco de vez em quando me parece bom! O que diferencia uma obra da outra é o mistério que virá quando a obra se abra e se desvende, como diria Drummond, “com seu poder de palavra e seu poder de mistério”. Gosto muito de indicar meus contemporâneos e conterrâneos: Marcelino Freire, Delmo Montenegro, Pietro Wagner, Wellington de Melo, Jacineide Travassos, Leonardo Leão, Cristhiano Aguiar são excelentes pedidas! Há também, aqui em Pernambuco, os mestres da Geração de 1965 e toda uma geração de poetas que vocês mesmos divulgaram numa edição anterior em homenagem à UBE. Quem quiser também pode ler um tal de Marcos de Andrade Filho (risos).
Divulga Escritor - Marcos, qual a mensagem que você quer transmitir ao leitor através de seu ensaio “Manuel Bandeira: o menino-poesia… eterno”?
Marcos Andrade - Esse ensaio nasceu de um convite que me foi feito pelo crítico literário André Cervinskis, que estava realizando um ciclo de comunicações acerca da obra do poeta recifense por ocasião de uma efeméride bandeiriana. Bandeira ianugura meu Paideuma e eu nunca escondi isso, pelo contrário: meu amor pela poesia de Mané está patente no poema que abre meu livro “Spollivm” e que já havia sido garimpando pelo professor e dramaturgo Robson Teles, que o utilizou como epílogo de sua peça “Passos por Pasárgada” (‘Uma casa de ideias’, Ed. Bagaço, 2005) e pelo próprio André Cervinskis que o fez de epígrafe para seu livro “A identidade do Brasil em Manuel Bandeira” (Fundarpe/Livro Rápido, 2008). A mensagem do ensaio é a de que Bandeira é uma das mais finas flores da nossa lírica e que o menino que não quer morrer que o poeta fala em “Versos de Natal” tem uma voz e uma dicção própria na obra bandeiriana. Encontrar o timbre desse menino é encontrar o brilho mais sublime da Estrela de uma vida inteira que poderia ter sido e que foi, sim!
Divulga Escritor - De que forma está construído o ensaio “Vida, mistério e milagre: a poesia de Esther Sterenberg”?
Marcos Andrade - Esse ensaio é interessante e inusitado. Esther é minha amiga e uma poetisa delicada, é psicoterapeuta renomada no Recife e um ser humano lindo. Ela é judia e, lendo sua obra de maneira quase cabalística, verifiquei que os poemas de número 12 de seus livros tinham entre si uma ligação mística, de mística judaica mesmo. Analisei-os à luz desse viés. Usei o simbolismo judaico como base teórica para ler a poesia de Esther, que é membro da Academia Recifense de Letras e de outras muitas instituições literárias pelo Brasil e no exterior. Algumas leituras que fiz foram numerológicas, em torno do número 12. Por exemplo, a mística do número 3 e do número 4, já que 3 x 4 = 12; a mística dos números 1 e 2 que se justapõe em 12, enfim... Dessas leituras emanaram o judaísmo, a maternidade, a própria poesia, a perda do sentido da visão, temas íntimos e caríssimos a Esther. O resultado foi um ensaio que deixou a própria Esther tão entusiasmada que ela reuniu os poemas analisados em uma antologia intitulada “O décimo-segundo”, que tem meu ensaio como prefácio.
Divulga Escritor - Onde podemos comprar os seus livros?
Marcos Andrade - Algumas de minhas produções foram publicações oriundas de prêmios e antologias, o que torna o acesso a elas um pouco difícil, em virtude da natureza da publicação e da tiragem reduzida. Nesse caso, apenas nas bibliotecas se teria acesso. Os amigos e alunos me dizem que acham com facilidade os meus livros “Não-Lugar” (prefácio de Lourival Holanda e orelhas de Robson Teles) e “Spollivm” (prefácio de Bianca Campello e posfácio de Melchiades Montenegro) nas livrarias, nas respectivas editoras e pela internet.
https://www.livrariacultura.com.br/p/nao-lugar-7011243
https://www.loja.edufpe.com.br/portal/spring/livro/detalhe/349
https://www.bagaco.com.br/produtos_descricao.asp?lang=pt_BR&codigo_produto=524
E-mail do poeta: marcosdeandrade@teachers.org
Facebook do poeta:
Perfil 1: www.facebook.com/marcos.deandradefilho
Perfil 2: www.facebook.com/marcos.deandradefilho2
Divulga Escritor - Você é membro da UBE, Instituição pela qual temos grande admiração. Conte-nos qual o objetivo, com que periodicidade é realizado e como participar do projeto “O sagrado na literatura”?
Marcos Andrade - A proposta é a discussão das relações entre a Literatura e o Sagrado em suas diversas manifestações, abordando temas que podem ir desde a Literatura como manifestação do sagrado (como acontece com os Livros Sagrados das mais diversas expressões religiosas, por exemplo) até interfaces entre Literatura e Religião, Literatura e Fé, Literatura e Rito, Literatura e Mito, enfim... o céu, sem trocadilhos, é o limite (risos). O programa ficou aprovado para os meses de março, maio, julho, setembro e novembro, intercalado com o Seminário de Historiologia Pernambucana, coordenado por Melchiades Montenegro, sempre na terceira quinta-feira do mês. Estamos contatando o primeiro palestrante, pois é meu desejo que o primeiro evento seja já no dia 19 de março. Naturalmente, dependemos muito da disponibilidade dos convidados, mas estamos na luta para que o cronograma pensado seja realizado. Os eventos podem ocorrer na sede da UBE, no Recife, ou em locais alternativos de comum acordo com o convidado.
Divulga Escritor - Quais as melhorias que você sugere para o mercado literário no Brasil?
Marcos Andrade - Interessante você me perguntar isso justamente quando falávamos da UBE. Hoje, não há pessoa mais indicada para falar desse tema que o Presidente da UBE, o escritor Alexandre Santos. Ele, sim, falaria com a devida propriedade. Mas tenho uma opinião sobre o assunto. Atualmente, é difícil pensar em mercado literário fora do eixo Centro-Sul do Brasil, o que é uma lástima. Existe ainda um verdadeiro êxodo de escritores do Norte-Nordeste para, digamos assim, “entrarem no eixo” (risos). Eu não vislumbro maneira mais eficaz e contundente para um repensar dos paradigmas do mercado literário nacional a não ser o fortalecimento da UBE em caráter verdadeiramente Nacional, a fim de levar a termo políticas sérias nas diversas esferas da administração pública e travar parcerias sólidas com a iniciativa privada para fomentar a produção literária nacional. Estou certo de que Alexandre Santos e sua equipe estão lutando bravamente para alcançar esse objetivo que só beneficiará os escritores deste País.
Divulga Escritor - A música também é uma de suas paixões. Ela exerce influência sobre sua poesia?
Marcos Andrade - Sem dúvidas! Ao falar de poesia, Verlaine já dizia: “De la musique avant toute chose”. Meu pai foi o grande responsável pela formação de meu gosto por música popular e minha mãe, pelo meu gosto por música erudita. Quando ingressei no Centro de Artes e Comunicação da UFPE foi inevitável circular pelo Departamento de Música. O professor da UFPE e maestro membro da Academia Pernambucana de Música Flávio Medeiros foi meu tutor nesse mundo maravilhoso. Ainda hoje, quando escrevo, me apanho buscando não um verso, não uma palavra, mas um som, uma pausa, um silêncio, um acorde, uma cadência, um ritmo! Escrever poesia é para mim encontrar essa ancestral irmandade entre Literatura e Música, que fez da Lira o símbolo de ambas as artes.
Divulga Escritor - Pois bem, estamos chegando ao fim da entrevista. Agradecemos sua participação no projeto Divulga Escritor. Estamos felizes em conhecer o pensamento do escritor Marcos de Andrade Filho. Que mensagem você deixa para nossos leitores?
Marcos Andrade - Eu é que agradeço a oportunidade que o “Divulga Escritor” me dá de poder falar daquilo que mais amo. Espero que os leitores não esqueçam que a Literatura é fome de beleza na alma do homem e isso faz com que sejamos construtores melhores de algo digno de receber o nome de Humanidade. Leiam sempre, valorizem os escritores nacionais, olhem com carinho para a Literatura Nordestina e invistam na produção dos jovens escritores contemporâneos, comprando seus livros, editando-os, divulgando-os, dando-lhes espaço nas instituições representativas dos escritores e nas Academias de Letras e de Artes, sem preconceitos! Tenho certeza de que os leitores de “Divulga Escritor” serão grandes responsáveis pela perene renovação, oxigenação, digamos assim, do público consumidor de Literatura de qualidade. Parabéns pelo belíssimo projeto e, mais uma vez, muito obrigado.
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