MARIA
Por Mirian Menezes de Oliveira
Maria era “das antigas”: mulher educada para se casar e ter filhos. Nos primeiros anos da infância, foram-lhe ensinados os ofícios de uma “senhora do lar”.
Sim! Nossa protagonista bordava, costurava, tecia... Nada aprendeu sobre o amor que, para ela, era privilégio de poucos.
Em seu modesto lar, comia um pedacinho de carne, somente nos dias de festa, que eram raros. Imensa era a dificuldade financeira daquela família! Tímida, às vezes, sorria... mas nunca olhava nos olhos das pessoas: “problema” que superou, depois de muitos anos de vida.
Numa época, em que crianças e mulheres eram “aproveitadas”, nas linhas de produção das fábricas, Maria aprendeu a trabalhar “duro”, para auxiliar no sustento da casa.
Menina franzina, possuía o apelido de “Fiinha” (jovem moça, que dizia sempre amém!) Sempre?!
Cresceu...
Sentia-se uma jovem “vazia”, chorava pelos cantos da casa, sentindo-se “sem graça”, sem amigos e “inútil”!
“Sou dona de mim?”
Seus pais vigiavam a “menina-moça”. O irmão mais velho, que “vingou” dos quatro que morreram, era muito “chato”!
Fiinha (para os mais íntimos!) aprendeu dizer: sim, sim... sim!
Não se enxergava “forte”, apesar de tantos feitos. Menina-moça-mulher... debutou sem bolo de festa, afinal de contas, tinha que tecer na fábrica, para ganhar seu minúsculo salário.
Quinze... dezesseis anos... Um rapaz mais velho apaixonou-se por Maria... Esperava-a todos os dias, na saída da fábrica!
Menina-moça (quase mulher!), sentiu que o amor era apenas um olhar diferente... Talvez, fosse o que sentia! Como saberia?!
Casou-se aos dezessete, mas quis a natureza que engravidasse aos vinte e dois.
Um esposo... um casal de filhos... Maria era a “senhora do lar”, dedicando-se aos seus e costurando roupas masculinas e femininas para clientes clandestinos, sem a PERMISSÃO do marido. Ai dela, se ele descobrisse!
“Mulher minha não trabalha fora. Sou eu quem sustenta a casa!”
O esposo era boa pessoa, mas... Maria era feliz?
Questionou-se por toda a vida... “Seria uma mulher forte?”
Não saía de casa sozinha, nem mesmo para fazer compras; “costurou” escondida, por muitos anos, para garantir seu dinheirinho...
“Meu esposo é bom! Nada me falta, mas preciso trabalhar!”
A gerência daquele lar era toda dele: o mantenedor!
Vida estável?!
De maneira precoce, assim como em seu casamento, os anos lhe trouxeram a viuvez! Maria não sabia o que fazer... De repente, viu-se com as rédeas de sua dor... Um velório para administrar, dois filhos menores... a vida e a morte, em suas mãos.
Virou a grande página de sua existência, sentiu a mutação monstruosa e recordou-se do recente passado...
Percebeu-se como mulher FORTE! Por trás de cada “sim”, sempre havia a transgressão... o questionamento...
Submissa?!
(...)
Na verdade, a “menina-moça-mulher” sempre manteve as rédeas da vida, mesmo sem perceber. Protagonista de seus sonhos e dores... Lagarta e borboleta... MULHER!
In.: “O PROTAGONISMO FEMININO EM VERSO E PROSA” - SCORTECCI EDITORA– ANTOLOGIA DA REBRA – Organizada por Joyce Cavalcante – Presidente da Rede de Escritoras Brasileiras e lançada na 24ª Bienal Internacional do Livro em São Paulo – 2016.