Por Paola Patrício
Nascida em Alegre, interior do Espírito Santo, Marisa Rezende é pós-graduada em Língua Portuguesa e Redes Locais. É membro de várias academias de letras, incluindo a Argentina e Portugal. Ao longo da carreira ela idealizou vários projetos literários, todos muito bem sucedidos. Seu livro, O Outro Lado do Muro, é um romance que conquistou vários leitores dentro e fora do Brasil.
Boa Leitura!
O que levou você a seguir a carreira de escritora?
Marisa Rezende - Um sonho alimentado desde a infância. Minha mãe contava histórias e eu as imaginava criando. Aprendi a ler aos quatro anos com fluência – sem frequentar escola nesse período porque o governo não ofereceria, em Saquarema, estudo para essa faixa etária, sendo de família humilde, todo aprendizado veio de casa e das minhas próprias observações acerca do mundo –; mas antes, já identificava as palavras que sempre exerceram uma magia especial sobre mim. E quando eu descobri que uma mesma palavra podia conter muitos outros significados, encantei-me com as infinitas possibilidades da criação.
Decidi, nesse momento, que seria escritora sem me limitar a um único gênero porque todos me fascinavam. O interessante é, que ainda criança, criei uma imagem sobre mim mesma aos quarenta anos: imaginava-me sentada na frente de uma máquina de escrever, com alguns livros publicados jogados numa cesta, num lugar meio isolado, na varanda de uma casa que ficava à beira mar com as vidraças meio abertas, permitindo que a brisa esvoaçasse os meus longos cabelos castanhos e lisos na época, enquanto as ideias fluíam como uma dádiva presenteada pelos deuses. Via-me iluminada.
Produzi a vida inteira e, há muito dos meus textos espalhados por aí, mas a necessidade de sobrevivência, o excesso de trabalho, as minhas lutas contra as injustiças, meus envolvimentos sociais e as próprias dificuldades impostas pela vida, impediram-me de buscar meios de publicação. Sou uma dessas librianas intensas e verdadeiras, sempre no “bom combate”. Longe da perfeição, porém na busca por algo que se assemelhe, algo que me leve a um degrau a mais no caminho da evolução. Daí tolerância zero ao pior mal que assola nosso país: corrupção.
Ao completar quarenta anos, olhei para trás e quase entrei em depressão: quando não se realiza os sonhos da alma, o corpo físico adoece. Vi o universo abrindo-se para mim, pois compreendi a mensagem... Enfrentei as dores do corpo durante uma licença médica e nasceu meu primeiro romance.
Enquanto há vida, há o que se buscar. Só quero me dar ao luxo do arrependimento do fazer e não do imaginar ter feito. Foi assim que descobri a melhor de todas as coisas que, mesmo diante das limitações físicas impostas pelo tempo que degrada tudo, nunca é tarde para ser feliz e que a juventude é um estado de espírito.
De onde veio a inspiração para escrever o seu primeiro romance?
Marisa Rezende - Uma parte da história ambientada na infância e adolescência das personagens, final da década de 1970 e 1980, em Itaúna – Saquarema – RJ, já estava pronta dentro de mim. Acho que eu sufocaria se não a mostrasse ao mundo. O que mudou, ao longo dos anos, foi a maneira de contá-la.
Há duas viagens paralelas: presente e passado que se mesclam para serem resolvidos.
O grupo de amigos que busca, hoje, no íntimo da protagonista Alyna, as vivências que a levaram ao exílio na Inglaterra, foram surgindo naturalmente. Todos são inspirados em pessoas que passaram pela minha vida. E, a maior parte dos fatos, são baseados na vida real ou iluminados por ela.
Usei a cronologia da minha própria vida para não me perder na história e tenho muito para contar, pois vivi cada instante como se fosse o último. E a música, não posso deixar de falar dela, pois é o alimento da minha alma criativa. O universo soa-me como uma imensidão ecoando numa canção de amor. Lembro-me, de quando criança, deitar sozinha no meio das minhas flores, fechar os olhos e ouvir os sons que embalavam o meu ser. E tudo virava música dentro de mim. Em casa, diante do burburinho da família, ouvia meu radinho que tocava Beatles e tantos outros rocks maravilhosos. Acho que já nasci gostando desse estilo.
O livro só nasce – ou se desenvolve – depois que eu descubro a música que embalará a história.
Marisa Rezende - Como foi viajar pela Europa divulgando o seu trabalho?
Marisa Rezende - Foi uma experiência única, diferente de todas as outras. Representar meu país em lugares que valorizam a cultura e ser tão bem recebida como fui, é algo para se ter na memória num cantinho muito especial para se recordar naqueles momentos em que vida fica mais difícil. E, em cada país ou cidade, tudo foi distinto. Sempre tinha ido à Feiras Literárias como professora de Literatura, de repente, lá estava eu no São do Livro de Paris como escritora, sendo entrevistada e recebendo toda a atenção possível, conhecendo artistas plásticos de renome, participando de eventos chiquérrimos, fazendo contatos e amizades inesquecíveis.
Na Espanha, foi uma passagem rápida por Madri para um evento numa biblioteca com o objetivo de compor o acervo para os imigrantes de Língua Portuguesa. Senti-me honrada em contribuir com o patrimônio cultural na terra dos meus avós paternos. Emocionante estar de volta às origens.
Em Portugal, creio não haver palavras suficientes para expor o que senti. Não imaginava o quanto seria bom e representativo na minha vida. A receptividade das pessoas não se prendeu às formalidades dos eventos. O grupo todo foi abraçado como irmãos unidos pela mesma língua e sonhos. Fui imortalizada na Academia de Letras e Artes de Lisboa, numa cerimônia que incluiu, entre outras personalidades, Pilar Del Rio (esposa do falecido José Saramago, prêmio Nobel de Literatura). Palestrei na Universidade Pio XII, em escolas de Ensino Médio, lançamento em livraria, entre outras participações. Mas não posso me esquecer de citar uma Galeria de Arte, onde houve um coquetel e pude conhecer e interagir com nomes geniais da arte pós-moderna. Noite agradabilíssima.
A viagem, como um todo, foi de grande aprendizado. Talento unido à humildade e educação geram pessoas especiais que podem mudar o mundo. E, ao contrário do que a mídia nos passa, o brasileiro é um povo muito querido em todos os lugares e nossa cultura cada vez mais respeitada. Os convites para retornar são muitos. Eu já conhecia a Europa como turista, mas como alguém levando suas ideias e vivências para plateias atentas, recebendo elogios verdadeiros, marcou a minha vida de tal forma que a modifiquei imensamente ao voltar.
Ano passado, além da turnê europeia e brasileira, também estive no Chile e foi inesquecível.
Como é ser escritora no Brasil? Quais as dificuldades?
Marisa Rezende - Algo muito difícil e, ao mesmo tempo, maravilhoso. O prazer está no reconhecimento e emoção provocada no leitor que vai à Internet e expõe seus sentimentos em relação à obra e ao autor. E, quando tem oportunidade de estar próximo, não perde tempo e expressa todo o seu carinho.
A maior dificuldade é conseguir uma boa editora que tenha uma distribuição razoável e que seja honesta no repasse dos lucros ao autor, sendo este o que menos recebe em todo o processo. Sem ter alguém que indique é quase impossível. Não há investimento no autor nacional, precisando lançar mão da autopromoção. Ainda bem que estamos na era da Internet e isso ajuda muito.
Entretanto, há um ponto muito importante a ser observado em relação às editoras sob demanda que lucram com o autor e não com os leitores. Outra dificuldade está no controle das vendas, algo impossível dentro do método tradicional. E, como em qualquer outro tipo de comércio, há muita fraude. Por isso, aconselho a quem está iniciando, trocar muitas ideias com outros escritores para entender um pouco como o mercado funciona e não cair em golpes.
Esse ano você viajou para o Paraguai. Como foi a receptividade dos paraguaios com a sua obra?
Marisa Rezende - Superou todas as minhas expectativas. Foi uma experiência engrandecedora. É um povo receptivo, simpático, com o qual pretendo fazer grandes negócios. Entretanto, o foco principal da minha visita e ida há várias entrevistas, foi anunciar minha trilogia “Não Feche os Olhos”, escrita em parceria com o escritor uruguaio Jorge F. Méndez, que já foi traduzida para o espanhol. Ainda não há previsão de lançamento. E, aqui no Brasil, estamos aguardando uma editora que seja compatível em qualidade e distribuição com o grupo espanhol Santillana.
Pretende traduzir o seu livro para outras línguas? Quais?
Marisa Rezende - Em princípio, para o espanhol, Inglês e francês. Mas, antes, farei uma revisão, uma nova capa e um novo lançamento em Português. DO OUTRO LADO DO MURO é uma história que merece um carinho especial e chegar a um público cada vez maior.
Tem algum lançamento em vista?
Marisa Rezende - Sim, mas ainda não tenho uma data específica.
Pretende escrever sobre outros gêneros?
Marisa Rezende - Eu escrevo em todos os gêneros; mas o que me dá maior prazer é romance e, mesmo assim, não ficarei só na nas histórias românticas porque adoro ficção científica, suspense e o sobrenatural. Tenho uma coletânea de poesias pronta para lançar, peças de teatro, contos, crônicas e roteiro para cinema. Vou investir, também, em histórias infantis. Estou me organizando para começar a viver em função da Produção Literária.
Quais autores te inspiram?
Marisa Rezende - Foram tantos ao longo da minha vida que fica difícil citá-los sem cometer injustiça; então, vou mostrar apenas alguns: Hans Christian Andersen que me sonhar em conhecer a Dinamarca; José de Alencar; Lima Barreto, Clarice Lispector – minha musa inspiradora –; Cecília Meireles; Fernando Pessoa; William Shakespeare; José Saramago; Charles Dickens; Hermann Hesse; Vladimir Maiakovski; Fiódor Dostoievski; Leon Tolstoi; Victor Hugo; Simone de Beauvoir; Jean-Paul Sartre; Friedrich Nietzsche; Julio Verne; Philip K. Dick; H. G. Wells; Gustav Meyrinck; Dan Brown; Alan Kardec... e por aí vai porque a lista é imensa.
Você acha que a literatura brasileira está revolucionando?
Marisa Rezende - Com certeza. Passamos uma fase cultural muito ruim, tanto na Literatura quanto na música e em outras expressões da arte. Mas a Internet veio como uma ferramenta maravilhosa para resgatar toda a nossa cultura. Os blogueiros, por exemplo, fazem um trabalho maravilhoso de divulgação dos autores nacionais. As redes sociais aproximam o escritor do público que pode, inclusive, trocar ideias sobre as obras. O autor se autopromove, mostrando o seu trabalho sem necessitar da mídia convencional. E há muita gente com talento surgindo e muitos meios novos sendo criados para facilitar essa interação autor-público. Sou muito otimista quanto ao nosso futuro literário.