Por Silva Neto
Aqui estou, a milhões e milhões de quilômetros da Terra.
Sou habitante único da mais recente descoberta cósmica do homem.
Estou em Vegas, a Estrela Gigante.
De uma das suas extremidades olho o cosmo imenso e, diante da fantástica beleza do Universo, esqueço a frieza ao redor de mim. Vejo asteroides, estrelas, planetas, pontos luminosos multicores no espaço infinito, girando em torno de Vegas, espetáculo nunca antes imaginado pelo homem.
Aqui, é também frio, bastante frio, gelado, como são terrivelmente frias estas rochas, estes cristais luzentes, esta brisa.
A luz intensa que brilha por trás de mim, também fria, projeta uma sombra gigantesca no espaço, minha sombra, transformando algumas regiões da Terra em noite.
Pelos meus cálculos, embora deteste cálculos, é Noite de Natal no Brasil.
Daqui, homem que sou, vejo os homens também complicados e frágeis iguaizinhos a mim, sonhando sempre alto demais.
Eles fazem conquistas amorosas e projetos materiais impossíveis de serem realizados.
Têm um coração cuja finalidade é de bombear um líquido vermelho chamado sangue, através de um sistema complexo de vasos sanguíneos, mantendo todo o corpo a uma temperatura média de trinta e seis graus centígrados. Entretanto, atribuem a esse órgão a função do sentimento humano de amar, perdoar, odiar, só porque o pobrezinho é sensível a tudo que ocorre ao seu redor.
Eles têm um cérebro perfeito para suprir todas as necessidades de pensar, criar, realizar, no entanto, usam menos que dez por cento dessa engenhosa máquina.
O computador é um dos seus inventos mais perfeitos, e não sei por que se admiram tanto de seu funcionamento, como as galinhas se espantam após botarem seus ovos. Tudo para eles é impossível, quando é possível e possível quando é absolutamente impossível. Eles se complicam entre si, destruindo-se uns aos outros em guerras sangrentas por quase nada.
Daqui de Vegas é que podemos avaliar a selvageria do ser humano e sua real capacidade em usar o cérebro que possui.
Sim..., Como havia calculado, há pouco, era noite de Natal no Brasil. Isto porque Vegas gira à velocidade do pensamento.
Daqui, via meus dois meteoros em formação (formação humana), brincando ao redor da Árvore de Natal. Estavam contentes com seus brinquedos novos, suas ilusões... Eles nem sonham em vir para Vegas. Afinal, ninguém os mandou seriamente para cá, ainda.
Só dizem, _Saem prá lá, meninos! Mas eles não entendem para onde ir porque ainda são crianças.
Eu, que me encontro aqui, há alguns anos, (anos Vegas), é porque me mandaram seriamente para cá.
Há quilômetros e quilômetros da Terra, nesta estrela fleumática, gélida, horripilante, sinto saudade do Sol do Nordeste, da Praia de Boa Viagem, da cerveja Antarctica geladinha, do bom bate-papo, do calor humano.
Até parece brincadeira imaginar tudo isso a distâncias nunca antes imaginadas pelo homem. Mas, estou em Vegas e, por uma razão muito simples, sinto saudade até dos comerciais fantásticos de cigarros, dos carros luxuosos, dos iates, dos bons whiskies, e das mulheres bonitas que nunca tive. Isto porque sempre estive em Vegas, desde a idade da razão.
Aqui, sou uma sobra enorme que transforma os dias em noites em quase todas as regiões do Planeta Terra. Graças à projeção de minha sombra ( porque sempre estive nas extremidades), transformo os dias em mil e uma noites, alegro os boêmios, os poetas, todos os noturnos, retorno ao lar os diurnos... Sou até Noite de Natal para a humanidade Cristã!...E tem mais... Aqui, sou único e útil, porque sou único aqui...
No Planeta Terra, não seria sequer a sombra do que sou verdadeiramente eu, mesmo se os homens e eu usássemos a capacidade plena de nosso cérebro.
OBS:
Este texto foi escrito pelo Autor em plena Noite de Natal de 1984, olhando o firmamento de sua janela, após o noticiário da descoberta da Estrela Vegas pela NASA.
Reflete um estado de mente, um transporte às esferas infinitas do cosmo.
Publicado em 11/01/2014