O ESCRITOR
–Onde estou? Não reconheço este lugar! A luz fere meus olhos.
–Onde você pediu! No corredor da inspiração. Feche os olhos e enxergue com a mente. A luz serve para escorraçar a palavra pensada, a origem do verbo, o sonho em devaneio. Sem luz é mais apropriado.
Foi assim que ele foi parar naquele imenso corredor com uma miríade de pequenas lâmpadas luminescentes, apenas orientando seu lugar onírico de escritor.
–Este corredor não tem fim? Parece que vejo um canto escuro adiante, em frente a uma fissura na parede, o que será?
–O corredor tem o tamanho dos seus desejos, e o canto não é escuro, é obscuro e a fissura pode ser aberta pelo gigante das montanhas; depende apenas de sua vontade e fantasia.
O gigante foi convocado para a tarefa de abrir uma janela na parede que ficou enrugada quando mãos enormes a afastaram para os lados. Daquele ponto, a guisa de minarete, podia-se vislumbrar uma vista infinita, com folhas planando ao sabor dos ventos, com flores e mares bravios chocando-se nas rochas, salpicando de espumas todas as aspirações na infindável praia de versos, organizados por estrofes e estribilhos; um rio de alusões corria manso na orla da floresta, umidificando os sonhos delirantes do escriba debruçado sobre a folha ainda em branco, esperando os primeiros rabiscos das mãos de seu mestre.
–Estou assombrado com tanto encantamento, com paredes debruadas com papel espelhado, refletindo versos sonhados no alvorecer do lirismo. Onde posso encontrar minha inspiração? Por favor, me responda!
–Sua poesia está guardada no recôndito de sua alma de seresteiro, de boêmio livre de censura. Para encontrá-la basta abrir o escaninho de sua vontade poética. Aos borbotões ela aparecerá iluminada pelas lâmpadas da imaginação. Segure firme o lápis, não trema os dedos, não vacile nas palavras, não dê asas à hesitação. Saiba que sabe, escreva o que sente, adeje nas asas da borboleta multicor buscando os versos ainda hesitantes. Procure na próxima curva, as letras no firmamento, e as use na sua escrita; desenhe versos com traços firmes e absolutos; certamente eles vão encantar os virtuosos. A literatura é a tela do artista, o manancial onde devemos saciar nossa sede de aprendizado e de cultura, o caminho do êxtase.
Assim foi que senti a força do espírito romântico no apogeu de minha vida de escritor interiorano...
...no corredor da inspiração, do tamanho de meus desejos...
Anchieta Antunes
Gravatá – 26/05/2014.