O F A R O L
( O S P A I S)
Nos confins do mundo, numa ponta de praia, ou em cima de uma pequena ilha, o Farol aterrorizado eternamente pelo murmúrio do mar, sofre a desproteção de uma mão amiga. O mar que balança incansável no seu vai e vem, e que tenta aproximar-se da vida na diminuta ínsula, molha os pés do velho Farol, e o enche de temores e solidão.
Os pais em qualquer parte da vida, sofrem no medo do filho os temores da perdição, que caminha audaz e altaneira pelos campos arados de vícios.
O chacoalhar das marolas nas pedras formam bolhas que mais parecem os olhos esbugalhados dos sapos noturnos, perscrutando a noite salpicada de brilho faiscando nas cristas das ondas. O céu furado de estrelas estende seu manto diáfano sobre todas as noites solitárias.
Escondidos nas noites escuras, estão a droga, o vicio e a repetição, a banalização do caráter, da vida, da retidão.
O Farol que se lança para o desconhecido como se fosse um aríete louco derrubando a cidadela da noite, ilumina segredos íntimos, devassa catedrais ocultas nas dobras do manto noturno, empurra a gaivota que em seu vôo retardatário, risca de branco o cone de luz; o Farol não serena a noite toda, laborando sua jornada, alertando os imprevidentes, acordando os sonâmbulos, vergastando os preguiçosos; não sossega enquanto não enxerga no horizonte os primeiros albores, momento de seu repouso.
Os pais lançam-se audazes contra o furor da delinquência que palpita nas ruas noturnas que levam os jovens pra casa. Só basta uma prova, e o brilho dos olhos apaga-se para sempre.
O dia, que navega o firmamento de um lado a outro, quando decide ir dormir no fundo do mar, passa no recanto do Farol e cochicha de mansinho em seu ouvido: “acorde, meu velho amigo de todas as noites, e vá salvar as almas perdidas nas vagas noturnas de um oceano indômito, norteie os que choram a saudade da vida que está por um fio, indique o caminho de casa para os que vagueiam ao léu, resgate a esperança de tantos que sofrem a solidão do abandono”.
No labirinto da vastidão de oportunidades, os pais precisam unir forças para resguardar a cidade intima do jovem inexperiente que navega os mares da urbe, caminhando de vão em vão, a curiosidade do desconhecido espúrio. Não há repouso enquanto o filho não dorme limpo de desejos, distante da língua venenosa da víbora que rasteja incólume pelos caminhos da fraqueza juvenil; só então os pais dormem o sono do dever cumprido, a alegria de um filho inteiro e sadio.
O grande olho desperta para a noite envolvente, brilha a salvação dos quase náufragos, faz renascer a promessa de vida para quem estava em desespero de morte. Como um raio mudo vai penetrando sorrateiramente na paisagem brumosa do primeiro escurecer, impelindo para longe do precipício a nau distraída; o Farol, com seu longo braço de luz estendido para o infinito, tem sua silhueta desfeita no corpo da escuridão. Trabalha doze horas ininterruptas, e quando o dia, preguiçosamente, desperta para brilhar
O FAROL DORME
ALAOMPE
Anchieta Antunes - Copyright
Gravatá – 30/07/2014.