por Ana Stoppa
E fez-se silêncio nos sonhos...
Talvez as águas em abundância, prenúncio de temporal.
Talvez o medo do desconhecido ou de se permitir.
Mas fato é que os sonhos silenciaram.
Debandaram sem nada dizer - até porque coisa de louco a ideia de os sonhos falarem...
Não ! Não!
Os sonhos não são ditos, porém sentidos.
Abriu-se a horrenda cratera da realidade.
No fundo, o charco à espera das almas indecisas.
Derivam as pobres embarcações na tola ilusão de alcançar o porto seguro.
Tentam de qualquer forma atracar sentimentos - precisam destes momentos.
Fato é que os sonhos silenciaram, um silêncio que corta feito faca amolada.
Um ontem de esperança desaguado no caos do inexplicável.
Mas, diriam os poetas, os loucos de todos os gêneros, os solitários, os desprovidos de afeto...onde se fez este caos?
Talvez perdidos na intolerância, no juízo precipitado, na indisposição do se doar...
Quando a paixão arrebata, desperta a alma para a vida...
Mas talvez, não sei, e se estas almas estão habituadas à letargia?
Não! Não pode ser!
Recuso-me a acreditar que os sonhos se calam!
Mas os sonhos se calam?
Caladas navegam as almas na escuridão que margeia as águas da agonia, momentos de enlevo intenso e de comunhão restam jogados na orla inexplicável da indiferença.
Mas, os sonhos se explicam?
Não, por mais que se tente, não se domina, não se tem nos braços, não se pode acalentar.
Sonhos são dotados de longas asas, de modo que partem sem avisar.
No circo da vida cerram-se as cortinas, na caixinha de música adormece a sonhadora bailarina,
na percussão dos tambores a vida faz estripulias, na mágica da hora desaparecem os anjos,
acordam as serpentes, voam os pombos da paz, na plateia distante corações assistem impotentes a debandada, vestida de cinza, as emoções represadas deságuam no pranto, encanto riscado de giz, rascunhos de felicidade.
Recolhem-se as lonas, descem as velas para atracar sem piedade os barcos dos sonhos na não rara inóspita realidade.
Mas, os sonhos adormecem, silenciam ou morrem?
Não sei...
Meu Deus, os sonhos silenciam nos cais sem despedidas, desprovidos de acenos.
Adeus sonhos bucólicos de pisar a relva molhada, de fazer seresta para a lua, de abraçar a simplicidade, de passear na praça, de se encantar com o coreto, de ver a vida verter na pradaria dos pampas.
Adeus porto da felicidade, que ao menos por uma lua mostrou-se na essência.
Silenciam compulsoriamente corações implorando migalhas de afeto.
Adeus, palavra ácida, dolorosa.
Adeus.
Fato é que silenciaram os sonhos, ou sonhos silenciaram?
Não sei...
Publicado em 13/01/2014