PIPA
Sou feito bicho esquisito
Criado na selva de pedra
Circulando entre multidões
Sempre cheia de “solidões”
Vazios que habitam cada canto do meu vasto ser
Repleto de almas mortas
Que um dia aqui passaram
Adornadas de almas vivas
Cujos beijos são doces expectativas.
Andarilhos de nós mesmos
Nas esquinas, faróis, avenidas.
Para além do alcance se esconder.
Converso com o tempo.
Pergunto por vocês
Responde-me, apenas, a pipa
Presa entre as mãos dos meninos palafitas
Rabiola de fitas
Olhos miúdos de tanto sofrer
Lá vai a pipa tocando a nuvem
Tão distante parece estar
Presa por um fio.
Balançada para nada fazer.
No ar, a pipa
Eu no chão
Cheia de parafina, sem nenhum pires para me esconder
Acesa em cordão
Queimando em ruas estreitas de paralelepípedos
Sob a áurea luz de uma lamparina da rua.
Foto: Meninos soltando Pipas (Cândido Portinari)