"Professores" em Professora - por Mirian M. de Oliveira

"Professores" em Professora - por Mirian M. de Oliveira

“PROFESSORES” EM PROFESSORA

(UMA EXPERIÊNCIA ANACRÔNICA DE (CO)FORMAÇÃO)

 

            Nesse momento em que deslizo a caneta sobre o papel... (Esse ainda é meu jeito predileto de colocar e recolocar as palavras!) tenho uma grande preocupação: escrever uma crônica anacrônica, pretensiosa, que possa ser lida e relida em diferentes momentos, sem a tarja do tempo. Digo “pretensiosa”, porque o tempo é o grande controlador de nossas vidas! Muitas vezes, proporciona-nos uma visão do futuro; em outros momentos, coloca o passado, batendo às nossas portas e, em outros, ainda, faz-nos apertar os olhos, para enxergar, com clareza, o presente... Apesar de controlador, Chronos é solidário, pois nos dá a sensação de que podemos controlá-lo, aprisioná-lo em recortes, ou imagens.

Há muito tenho vivido experiências valiosas em meu processo de (co)formação com professores de Sala de Leitura; digo (co)formação, porque aprendi este termo com duas consultoras incríveis: Maria de Mello e Heloísa Steffen, do CENTRO DE TRANSDISCIPLINARIDADE e desde então, não consegui me desgrudar da expressão. Pois bem... sou professora há mais de 24 anos e, desde 2000, trabalho como orientadora de componente curricular das Salas de Leitura da Rede de Ensino Municipal de São José dos Campos. (Ufa!) Para escrever tudo isso, tenho que respirar fundo, pois somente assim conseguirei expressar, com energia, todo o sentimento de pertencimento a uma rede de ensino e a um programa, que só me trazem alegria.

            Introduções à parte, em uma de minhas (co)formações, um “surto fotográfico” arrebatou-me: senti-me motivada a registrar todas as apresentações realizadas pelos professores, no Horário de Trabalho Coletivo (HTC), através de uma poderosíssima máquina digital, cujas pilhas não resistiram, tamanha a grandiosidade do evento! E nesse evento cotidiano, envolvendo a troca de experiências e a tematização da prática, constatei, claramente, os aspectos sincrônico e anacrônico da Educação. Os professores se colocavam de corpo e alma nas apresentações, vivendo papéis e desenvolvendo ações. Havia um clima mágico instalado entre os professores contadores de histórias, razão pela qual me esforcei, enormemente, para registrar os recortes preciosos do tempo (sem sucesso!). Gosto de organizar portfólios, mas confesso que entre uma página e outra há sempre uma lacuna a ser preenchida. Entre os apontamentos... entre as imagens... há enormes reticências, textos a serem lidos, entrelinhas.

No dia em questão, deixei de fotografar atividades incríveis: dramatizações, teatro de fantoches, declamações, paródias, jograis, porque as pilhas resolveram parar. Terceirizei o trabalho: pedi para outra pessoa executar o ofício, com uma máquina fotográfica mais potente e o resultado foi bom! As fotos ficaram lindas, porém, ao apreciá-las no computador, visualizei novamente as lacunas, as entrelinhas. Havia muita coisa a ser lida! Olhei para as fisionomias, para os recortes de cenários, para as apresentações congeladas e me vi em cada uma delas: “professora” em “professores”/ “professores” em “professora”. Lembrei-me de minha trajetória nem sempre tranquila como educadora; realizei um resgate à memória; tive boas recordações; lembrei-me das falhas... vibrei com as grandes vitórias; recordei-me de vários conceitos... enfim, brinquei com Chronos e Kairós. Ao realizar o resgate à memória, consultei as fotografias guardadas na mente, cujas cores ainda se mantinham e se mantêm nítidas, além do movimento (coisa impossível para uma foto comum!).

Ao ler os intervalos das imagens, li também as entrelinhas do tempo... “desse tempo” que, às vezes, corre de maneira desesperada e, outras vezes, parece congelado em algumas situações pontuais, ou em nossas concepções. Observei as feições de todos os professores que consegui capturar nas imagens; olhei-os como se fossem espelhos! Vi meu reflexo em cada um deles e senti suas fisionomias impressas na minha, como se fôssemos um só corpo e uma só alma... como se compartilhássemos da  mesma faixa no tempo e no espaço, independentemente da idade cronológica que nos “distancia” e de todas as reticências que se instalam entre nossos pensamentos! Vi uma multiplicidade de situações didáticas, de conceitos, de estratégias... Vi as diferenças, as semelhanças, a “sincronicidade”... Vi a trajetória espiralada da Educação, que vai se construindo nos recortes e nas reflexões, estruturando-se em mosaico (esteticamente perfeito!), composto de cores e texturas diferentes. “Professores” em professora!... Essa expressão tornou-se pulsante! E isso se deve ao fato de que sinto, atualmente, nos horários de HTC, o diálogo entre as diferenças. Nossos formatos e “personalidades didáticas” se acomodam, ajustando-se em um mosaico íntegro. Meu ser intercala-se aos dos outros educadores e juntos construímos uma identidade coletiva, forte, capaz de buscar novos caminhos.

No grande dia em que as pilhas da máquina acabaram, decidi escrever uma crônica anacrônica, capaz de ser lida por educadores de outras gerações, que, certamente, assumirão a construção coletiva da trajetória educativa. Educação é processo constante: possui presente, passado e futuro, mas, às vezes, eles se misturam, compondo novos quadros, onde as estações se enroscam. Enquanto educadores, temos a oportunidade de brincar com Chronos e Kairós (há um tempo que passa e um que não passa!)... Vozes, ideias e tempo transformam-se em um emaranhado!

Tenho consciência plena de que as ideias tornam-se maiores que seus autores, por isso há possibilidade de que, um dia, esse texto, escrito com base na maravilha do cotidiano, apareça na Internet, com a seguinte frase no final (Autor desconhecido), ou (Desconheço a autoria). Os diversos discursos que povoam o universo educativo, às vezes, ressoam como vozes estranhas, entretanto, não são raros os momentos, em que as falas se combinam em uníssono, ecoando o desejo de uma Educação renovada, compromissada e significativa. A multiplicidade de discursos que habita nossas mentes abre caminho para o “repensar” constante de nossas práticas, mas, para que isso aconteça, a abertura é essencial; precisamos aguçar nossos sentidos e ouvir os professores que existem em nós, para que o mosaico seja estruturado... e belo!

Naquele dia de HTC, em que tive a pretensão de registrar os recortes do tempo, optei por uma crônica anacrônica. (Este gênero textual me agrada muito! Permite-me refletir!) Afinal, essa tem sido minha rotina, enquanto (co)formadora: reflexão-ação-reflexão. Toda vez que olho fotos e rabiscos, vejo coisas diferentes; capto nuances e matizes novos, porque Chronos é brincalhão: não se deixa fotografar, mas dá amostras grátis de sua existência!

 

MIRIAN MENEZES DE OLIVEIRA

 

Observação: Esta crônica anacrônica possui data de nascimento e de validade em Chronos – 2000 a 2014, porém em Kairós, é eterna...

 

 

 

 

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