São Bernardo e sua especificidade literária - por Mauricio Duarte

São Bernardo e sua especificidade literária - por Mauricio Duarte

São Bernardo e sua especificidade literária

 

A boa prosa não pode ser convertida em poesia.  Ela é romance, conto, crônica ou artigo e conta uma história, longa ou curta, explana uma ideia ou emite uma opinião.  Assim é com toda prosa de qualidade superior e assim é com São Bernardo por Graciliano Ramos.  O romance, um clássico do renomado autor, é uma crítica à situação sócio-política da época.  E por causa de sua linguagem – fora da linguagem poética – é excelente como história porque carrega opostos num mesmo contexto do enredo; ainda que, no entanto, não faça desses contrastes um cristal, um poliedro, conforme diz Domingos Carvalho da Silva em “Uma Teoria do Poema”, mas é “radial e aprofunda os seus pormenores em todas as direções”.

Ora Paulo Honório, fazendeiro personagem protagonista do romance, tenta convencer Madalena a casar-se com ele, elogiando seus conhecimentos acadêmicos e sua posição como professora, ora, anteriormente, tenta convencer Dona Glória a fazer com que a sobrinha dela, Madalena, abandonasse a carreira de professora por ser mal remunerada.  Esta multitudinária cosmogonia dos mundos interiores e exteriores, que se entrelaçam entre si, são todas partes da obra e demonstram a sua grande relevância.  A rudeza, a violência e a truculência de Paulo Honório também contrastam com a sensibilidade de Madalena, que depois, já casada com o proprietário de fazenda, acaba por suicidar-se, sufocada que estava com o relacionamento frustrante e aterrador, em muitos aspectos, com Paulo Honório.

O narrador-personagem, aliás, já no capítulo 1, se torna como que um símbolo da questão arte/linguagem, ao “esconder” o Graciliano Ramos-escritor e metamorfoseá-lo em narrador-personagem fazendeiro, que decide escrever um relato.  Tal forma de narrar vai se mantendo ao longo do romance, no qual diversas vezes, o personagem acusa Gondim – e outros colaboradores-personagens da escrita de Paulo Honório – de pernosticismo, de idiotia e de safadeza, por não terem suas colaborações escritas, aproximação com a linguagem oral, conforme salienta Godofredo de Oliveira Neto em posfácio do próprio livro.  Graciliano Ramos, ainda de acordo com anotação de Godofredo de Oliveira Neto, “não está procurando propriamente uma realidade oral”, mas aproximar a carga simbólica da escrita do simbolismo da oralidade.  “O essencial da história que o narrador tem na memória – ou na imaginação – não pode ser compartilhado. Aquela realidade (...) só poderá ser descrita pelo próprio Paulo Honório.”

Os conflitos internos do homem, ser humano contemporâneo de 1930, são tema dessa inegável fabulosa obra literária.  A miséria do personagem fica patente em todos os seus contornos e demonstrada como crítica da estrutura social da época – e, muito provavelmente, até hoje, de um modo ou de outro – com valor literário inestimável.  Vale a pena, sem dúvida, ler e reler, sempre, Graciliano Ramos em São Bernardo.

Mauricio Duarte (Divyam Anuragi)

 

Referências bibliográficas:

São Bernardo . Graciliano Ramos  . Editora Best Bolso . Coleção Vira-Vira .  4ª. Edição  .  Rio de Janeiro . 2012

Uma Teoria do Poema . Domingos Carvalho da Silva . Editora Civilização Brasileira . 2ª. Edição . Rio de Janeiro . 1986

 

 

 

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