Saudade de Meus Desfiles Escolares
Por Silva Neto
Estudei no Colégio Diocesano de Garanhuns, muito rígido por sinal, porém, uma referência em estudos naquela Cidade e em todo o Estado de Pernambuco. Tinha um Diretor vitalício chamado: Padre Adelmar da Mota Valença. Os alunos chamavam-no de “Cavaleiro Negro”. Era muito seco e confesso, nunca o vi sorrir. Porém, sua irmã era um doce de pessoa, tinha a função de Coordenadora, e todos recorriam a ela como que fosse Nossa Senhora. Na verdade ela fazia o mesmo papel de intercessora junto ao Diretor, por nós, na hora em que cometíamos alguns deslizes. Eu era muito comportado, não precisava recorrer nem a ela nem ao padre, pois, nunca cheguei atrasado. Os alunos que chegassem atrasados não encontravam seus cartões de frequência na chapeira junto ao relógio de ponto. Esses seriam recolhidos pelo próprio Padre e levados para sua sela. O aluno tinha que ir buscá-lo no birô do Padre. Que fria! Que bronca tomavam!
Os desfiles eram obrigatórios naquele colégio. Sendo eu muito tímido e complexado com a minha estatura diminuta para minha idade, passei, com isso, poucas e boas, servido de motivo de bullying pelos colegas e assistentes aos desfiles.
Aos quinze anos, falava grosso, barba engrossando no rosto, ainda desfilava entre os meninos de nove e dez anos, bem lá atrás, na fila, por causa de minha pequenez. Na hora do desfile os assistentes identificavam-me pela cara de velho entre às crianças e diziam: — Olha ali!... —Cara de homem feito entre as crianças! —Velho!...—Velho! —Anão! —Barbudinho!... Não me deixavam em paz.
Só faltava morrer de vergonha e raiva sem ao menos poder dar uma resposta.
Odiava tudo aquilo.
Jurava não mais desfilar, porém, não tinha coragem de faltar. Se não desfilasse perderia pontos e levava suspensão.
Ano seguinte, com quase dezesseis anos, menos de um metro e meio de altura, tomei uma decisão inédita. Fui à Coordenadora, D. Almira, a Nossa Senhora dos incautos, em busca de proteção. Muito tímido e complexado, arranjei coragem não sei onde e, diante dela, disse-lhe: — A Senhora dispensa-me de desfilar este ano? Ela indagou qual seria a justificativa. Eu disse-lhe que não podia desfilar entre os meninos novos porque já tinha dezesseis anos e não era mais um garoto. Ela olhou para mim, sorriu e disse: — Vou dar um jeito! — Volte à classe e, quando tiver perto do desfile, avise-me. Fui contente para a sala de aula.
O mês de Setembro estava perto. O colégio já fazia os ensaios para o desfile quando, numa tarde, ao avistar D. Almira, fui ao encontro dela lembrando-lhe o que tínhamos combinado. Ela falava baixinho com o Instrutor, enquanto eu, apreensivo e envergonhado, esperava o que ela tinha a me dizer. Sem palavra alguma ela me toma pelo braço colocando-me entre um bloco de alunos e outro dividindo o pelotão ao meio. Pensei comigo!... — Agora é que as pessoas vão me ver mesmo! Após o ensaio voltei à Coordenadora, fiz-lhe a queixa, enquanto ela me explica:
— Fique tranquilo, Joãozinho, darei um jeito.
Eu confiei e não mais a procurei.
No dia do desfile estava eu dividindo o pelotão com uma enorme Bandeira do Brasil. Quando os assistentes olhavam para mim de um lado da rua eu tapava a cara com a Bandeira. Fazia a mesma coisa quando, do outro lado, olhavam para mim. Finalmente, aquele desfile e dos anos seguintes foram maravilhosos!
Mas não fico por aqui com histórias engraçadas de desfiles escolares.
Um belo dia, próximo ao Sete de Setembro, as escolas já faziam seus ensaios para o desfile. Estudava na Escola Técnica Comercial de Contabilidade em Catende. O desfile não era obrigatório, mas, naquele ano, havia uma comissão julgadora para premiar o melhor desfile entre as escolas e colégios da Cidade. Além da Banda Marcial seria necessária uma boa representação de contingente de alunos e bastante criatividade para surpreender à Comissão Julgadora. Mais um pesadelo a enfrentar! Fomos convocados a desfilar. Lembrei-me do Colégio Diocesano de Garanhuns. Iria desfilar lá atrás entre os menores dos menores, por ser pequeno, embora, um garotão de dezenove anos. Mas, agora se tratava de um desfile entre rapazes e moças e não meninos de dez anos. Os rapazes falavam grossos e tinham barbas como eu. Qual seria o problema se já havia enfrentado situações bem piores que aquelas? Pensei!
Achava bonita a Banda Marcial. Era um sonho desfilar tocando um instrumento seja de percussão ou de som. Existiam cornetas, saxofones, gaitas, flautas, clarinetes, pratos, tarôs, bumbos, surdos, zabumbas e tantos outros instrumentos pequenos! Aureni, um rapaz muito engraçado, teve a ideia de arranjar um bumbo para mim, daqueles que usam vertical colocado no peito e com duas faces laterais para bater de um lado e outro. Contudo, aquele bumbo era muito grande e pesado. Se colocassem em mim eu cairia para frente ou o arrastaria no chão. Foi quando meu amigo Antônio deu uma ideia: — Vamos buscar o bumbinho da banda infantil?! O bumbo pesado ficou com o Aureni.
No dia do desfile foi bastante engraçado, deram-me o itinerário e lá vou eu imponente guiando a tropa, parecendo Napoleão Bonaparte. Todo empolgado, tom!...Tom!...Tom! Suava frio, mas não sabia que minha popularidade daí pra frente teria tão grande repercussão positiva, como teve. Foi um sucesso o desfile, ficamos em segundo lugar na classificação geral. Só não gostei do apelido que me colocaram daí pra frente: “João Bumbinho”. Kkkkk!
Bons tempos aqueles!
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