Trilhos
Nunca tive a presunção de te conhecer
Não mais que superficialmente
Conheci-te pela rama sem nunca chegar às tuas raízes
Sempre com a sensação que te perdias em trilhos só teus
Onde vivias uma vida inventada por ti e para ti
E entretanto aguardavas
E aguardavas
E eu não sabia o porquê dessa demora
E perdias-te em madrugadas despovoadas
Por entre as pedras da calçada
E a cal deste casario
Numa esperança vã
Que as frestas do silêncio nocturno
Te revelassem enfim
O segredo para seres feliz
Nunca senti que te tivesses realmente entregue
Percebia-te sempre mais preocupada com os sonhos que não realizavas
Do que com a vida que corria por ti incólume
Sem nunca ser verdadeiramente vivida
Eras incapaz de largar essas tuas quimeras
E agarrar com a vontade de quem quer
Agarrar com ambas as mãos
As alternativas com que a Vida e Eu te quisemos presentear
E assim foste ficando a pensar obsessivamente
No que podia ter sido mas jamais chegava a ser
Numa espera lenta que te deixava vazia e de mãos a abanar
Tu eras como um relógio parado
Cativa num tempo só teu
Tu eras como uma fugitiva
Escondida entre as moitas ribeirinhas
Vendo o meu barco passar rumo a um porto mais seguro
Sem coragem de saltar para bordo
E eu nem sei dizer se chegaste a ser feliz
E eu nem percebi o que querias para ti
E foste incapaz de pronunciar por palavras o teu adeus
Escreveste em páginas e páginas
O teu cenário de despedida
Escreveste árvores, flores, raízes
Escreveste um céu pardacento e um sol fosco
Escreveste lágrimas em forma de chuviscos
E escreveste o canto das aves ecoando ao vento
E todo este cenário implorava que me lembrasse de ti
Como se fosse possível eu te esquecer